Friday, December 18, 2009

Trib.Administ.Sul declara nulo o derrube de pinhal na Aldeia de Juzo (anos 90)

Segundo sentença de 25.11.2009 (em www.gde.mj.pt), no 2º Juízo da 1ª Secção (Contencioso Administrativo) do Tribunal Central Administrativo Sul ... e peço desculpas pelo texto ser longo:



1 - RELATÓRIO

O Ministério Público, junto do TAF de Sintra, intentou nesse Tribunal acção administrativa especial de impugnação movida contra o Município de Cascais pedindo a declaração de nulidade: - da deliberação de 09.01.1998, da autoria da Câmara Municipal de Cascais, através do qual foi aprovada a reversão em favor da Contra-interessado C...de três parcelas de terreno que esta anteriormente havia cedido ao Município de Cascais, cedência essa titulada pela escritura pública de doação outorgada a 13.01.1983; - da deliberação da mesma edilidade de 29.07.1998, mediante a qual, como aditamento à deliberação de 09.01.1998, foi aprovada e reversão de parte das três parcelas de terreno anteriormente cedidas pela cooperativa C...ao Município de Cascais; - do contrato de reversão outorgado em 05.08.1998, e mediante o qual reverteram para a C...parte das três parcelas de terreno anteriormente cedidas/doadas pela cooperativa ao Município de Cascais e do contrato de compra e venda da mesma data e mediante o qual a Contra-interessada I...adquiriu as parcelas objecto da reversão mencionada; e da deliberação de 22.04.1998, da autoria da Câmara Municipal de Cascais, que aprovou a alteração ao alvará de loteamento n.º 704/84,prevendo o parcelamento em lotes de terreno para construção numa área que fora de cedência para o domínio público municipal. Requerendo ainda que seja determinado o cancelamento do registo dos actos de aquisição emergentes dos actos administrativos e dos contratos acima referidos.
Nessa petição foram indicados como contra-interessados a C...– Cooperativa de Habitação Económica dos Trabalhadores da Estoril-Sol e a firma I...- Gestão e Comercio de Produtos Lda.
Por acórdão de 07.07.2005, o Tribunal “ a quo” julgou a acção parcialmente procedente, declarando a nulidade da deliberação de 22.04.1998, da autoria da CM de Cascais, que aprovou a alteração ao alvará de loteamento n.º 704/84, predizendo o parcelamento em mais lotes de terreno para construção numa área que fora cedida para o domínio público municipal.
Inconformados com a decisão, quer o Ministério Público, quer a contra interessada INTERMEGA, recorreram para este TCAS.
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RECURSO DO MINISTÉRIO PÚBLICO :
O Ministério Público rematou a sua alegação recursória, do modo seguinte:
“I - Recorre-se da aliás douta sentença proferida nos autos, de fls. 268 a 306 (do processo SITAF), em função do decidido nos segmentos referenciados no decisório sob as alíneas a), b), c), e e), com o que se não concorda.

II- Com efeito, em tais segmentos decidiu o Mmo. Juiz a quo:
a) Não declarar a nulidade do acto administrativo datado de 09.01.1998, da autoria da Câmara Municipal de Cascais, e mediante a qual foi aprovada a reversão em favor da Contra-interessada C...de três parcelas de terreno que a mesma antes cedera ao Município de Cascais, cedência essa titulada pela escritura de doação outorgada a 13.01.1983.
b) Não declarar a nulidade do acto administrativo datado de 29.07.1998, da autoria da Câmara Municipal de Cascais, e mediante o qual, por aditamento à deliberação de 09.01.1998, foi aprovada e reversão de parte das três parcelas de terreno anteriormente cedidas pela cooperativa C...ao Município de Cascais.
c) Não declarar a nulidade do contrato de reversão outorgado em 05.08.1998, e mediante o qual reverteram para a C...parte das três parcelas de terreno anteriormente cedidas pela cooperativa ao Município de Cascais.
e) Não declarar a nulidade do contrato de compra e venda outorgado também a 05.08.1998, e mediante o qual a Contra-interessada I...adquiriu as parcelas objecto da reversão mencionada.

III- Pelo decidido foi pois determinada a parcial improcedência da pretensão processual do Ministério Público, e daí a razão do presente recurso por se continuar a entender que o quadro factual invocado no nosso articulado, e que aliás foi levado à sentença, era de modo a determinar diferente solução jurídica, justamente inversa à decidida e que agora se pretende seja reconhecida.
Vejamos pois:

IV - Por despacho datado de 17 de Novembro de 1977, da autoria do Presidente da Câmara Municipal de Cascais, fora aprovada uma operação de loteamento urbano para um prédio composto por várias parcelas de terreno, com a área total de 60.930m2, sito na Aldeia de Juzo, Freguesia e Concelho de Cascais, parcelas essas então descritas na respectiva Conservatória do Registo Predial sob os números 945, da 1a Secção, a fls. 142 do Livro B-28; 17600, da mesma Secção, a fls. 6v°, do Livro B-52; e 17601, também da mesma Secção, a fls. 7 do Livro B-52; 8961, a fls. 38, do Livro B-27; 21258- a fls. 15v°, do Livro B-63; 4118, a fls. 83 do Livro B-12; e 15567, a fls. 20 do Livro B-46; e inscritas na matriz predial da Freguesia de Cascais sob os artigos números 357, 466, 424, 359 e 355, todos da Secção 35.

V- Na sequência desse acto de licenciamento, que previa o parcelamento do prédio em 200 lotes de terreno para construção urbana, foi emitido a 18 de Dezembro de 1984 o respectivo alvará de loteamento, com o n°708/84, em favor da sociedade Chesol, como proprietária do prédio e requerente no procedimento.

VI - Por via do loteamento resultou uma cedência em favor do Município de Cascais de três parcelas de terreno, com a área total de 37.068m2, cedência consignada no alvará de loteamento e em escritura de doação irrevogável outorgada a 13 de Janeiro de 1983, num caso e noutro se mencionando que a cedência integrava três parcelas:
a) uma com a área de 12.130m2, destinada a arruamentos.
b) uma outra com a área de 3.900m2, destinada a edifício escolar.
c) uma outra com a área de 21.038m2, destinada a zonas livres (parque), também referenciada na escritura notarial como zonas verdes dispersas.

VII - Muito depois disto, mais precisamente a 02.10.1996, a C...veio requerer à Câmara Municipal de Cascais a devolução das parcelas de terreno, que antes cedera, o que lhe foi deferido pela deliberação da Câmara, de 9.01.1998, que aprovou a "...reversão das parcelas de terreno respeitante aos lotes cuja constituição será autorizada na operação de loteamento, com a área e confrontações definidas na planta n°7, constante do processo de loteamento".

VIII - Aliás mesmo antes de tal deliberação a C... apresentara, a 28.08.1997, um pedido de alteração ao alvará 708/84, com vista à constituição de mais lotes de terreno para construção nas parcelas que cedera ao Município, o que veio a obter por deliberação da Câmara de 22.04.1998.

IX- Posteriormente, em reunião de 29.07.1998, a Câmara Municipal de Cascais aprovou como um aditamento à deliberação de 9 de Janeiro de 1998, que antes aprovara a reversão em favor da C...das parcelas cedidas, nova autorização de reversão mas agora com a menção das áreas e descrição predial das mesmas.

X - Em função desta segunda deliberação a reversão consistiria:
a) numa parcela com a área de 2.517,70m2, a desanexar da descrição n°28.650, a fls. 1v°, Livro B-112, antes cedida para escola.
b)numa parcela com a área de 1.318,35m2, a desanexar da descrição n° 28.649, a fls. 100, do Livro B-111, que antes fora cedida para arruamentos.
c) numa parcela com a área de 3.490,65rn2, a desanexar da descrição n°28.651, a fls. 2 do Livro B-112, que antes fora cedida para parques, e zonas livres ou zonas verdes dispersas.

XI- Na sequência das mencionadas deliberações da Câmara Municipal de Cascais, de 09.01.1998 e de 29.07.1998, que aprovaram a reversão, foi outorgada uma escritura notarial no mesmo sentido, titulada «contrato de reversão», lavrada a 05.08.1998, por forma a transferir para o património da C...as três referidas parcelas de terreno, e ainda nesse mesmo dia esta sociedade vendeu à firma I...aquelas três parcelas de terreno mediante escritura pública de compra e venda.

XII - Sucede que, ao contrário do decidido na sentença, os actos administrativos mediante os quais foi autorizada a reversão em favor da C...são nulos e de nenhum efeito, e de igual nulidade padecem os subsequentes contratos de reversão e de compra e venda, mediante os quais se operou a transferência sucessiva de propriedade das três parcelas de terreno referenciadas nos autos.

XIII - Com efeito, a cedência das mesmas pela Chesol, e por via da aprovação da operação de loteamento urbano, determinou a sua passagem para o domínio público municipal, o que significa que passaram a constituir res extra commercium. Isto redundou na sua inalienabilidade, ou indisponibilidade legal, a qualquer título de acordo com o disposto no art. 202°, n°2, do Código Civil, e em função do regime daqueles bens.

XIV- Não era também sequer possível aprovar a reversão em favor da entidade cedente, porque se não verificarem os pressupostos que a lei então exigia para permitir a reversão. E de acordo com o disposto no art. 16°, nº 3 e 4, do DL 448/91, de 29 de Novembro, a reversão só seria possível se em função do comportamento do cessionário houvesse "...desvio da finalidade da cedência", e tal desvio não pode consistir numa pura omissão antes supõe um acto, material ou jurídico, de modo a aplicar o terreno a fim diverso daquele que determinou a cedência do bem, e que nunca existiu.

XV- Este pressuposto da reversão, que consta do art. 16°, n°3, do DL 448/91, é pois bem diverso do que resulta da norma do art. 5°, n°1, do Código das Expropriações (versão do DL 438/91), onde se basta uma mera não aplicação do bem ao fim que justificara a expropriação.

XVI - Ora, resulta que as parcelas de terreno não foram nunca utilizadas fará fim diverso do que determinara a cedência, a mera não utilização ou o estado de "zona verde não tratada" em que sempre se mantiveram era o que tinham à data da cedência e à da reversão, justamente porque da parte da Administração Municipal (Entidade Pública Demandada) nunca ocorrera uma intervenção sobre as parcelas, daí que os actos de aprovação da reversão, tanto o primeiro como o segundo, vieram autorizar uma transmissão patrimonial relativamente à qual vigorava uma proibição de intransmissibilidade, e daí a nulidade dos mesmos à luz do disposto no art. 133°, n°1, e 2, alínea c), do CPA, pelo seu conteúdo juridicamente impossível.

XVII - Por outro lado, mesmo a admitir que houvesse o direito à reversão, o que só por mera hipótese se admite, o certo é que à data em que a mesma foi requerida pela cedente, a firma Chesol, não era a mesma já possível pois que à data de 12.10.1996, quando aquela a veio requerer, por já haver caducado tal direito em função do disposto no art. 5°, n°6, do Código das Expropriações, aprovado pelo DL 438/91, e aplicável ex vi do disposto no art. 16°, n°3, do DL 448/91.

XVIII - É que a cedente tinha o prazo de 2 anos, a contar de igual prazo de 2 anos, este contado de 7 de Fevereiro de 1992 (data da entrada em vigor do Código das Expropriações pelo diploma apontado), para requerer a reversão o que significa que a devia peticionar entre 7 de Fevereiro de 1994 e 7 de Fevereiro de 1996, o que não fez, e daí a caducidade do hipotético direito em causa.

XIX- Deste modo, em função da caducidade não seria possível a reversão daí também por este lado a nulidade dos actos que a aprovaram por terem objecto juridicamente impossível (art. 133°, n°1 e 2, alínea c), do CPA).
A Câmara Municipal não poderia admitir a reversão, caducado o respectivo direito, por estar obrigada a agir com vinculação à lei nos termos do art. 3°, n° 1, do Código Civil, e a ela não poder renunciar (art. 330°, n° 1, do Código Civil), por se tratar de matéria subtraída à sua disponibilidade.

XX - Acresce ainda que ocorre igual nulidade dos actos administrativos por via da omissão do procedimento judicial previsto no art. 73°, n°1, do Código das Expropriações (cfr., também o art. 17°, n°1, do DL 448/91), pois que a adjudicação das três parcelas de terreno obrigava à intervenção do tribunal, só operando a transferência de propriedade mediante acto judicial, que foi simplesmente omitido, e não por escritura municipal, e daí a nulidade por usurpação de poder (art. 133°, n° 1 e 2, alínea a), do CPA).

XXI - A aliás douta sentença deveria pois ter declarado a nulidade dos actos impugnados à luz do ora concluído, por ser tal a lidima interpretação e aplicação das normas legais supra referidas.

XXII- Ocorrendo idêntica nulidade com os contratos de transferência patrimonial, supra mencionados, seja o de reversão seja o de compra e venda, em função da não produção de quaisquer efeitos jurídicos que é própria dos actos nulos (art. 134°, n°1, do CPA).

XXIII - Mostra-se pois, pela douta sentença, que o Mmo. Juiz a quo fez nela errada interpretação e aplicação da lei, mostrando-se que foram violadas as disposições dos arts. 202° e 330°, n°1, ambos do Código Civil, dos arts. 16º, n°3 e 4, e 17°, n°1, ambos do DL 448/91, e ainda dos arts. 133°, n°1 e 2, alíneas a) e c), e 134°, n°1, estes do CPA, os quais impunham a declaração de nulidade de todos os actos e contratos impugnados na acção, e consequente cancelamento dos registos prediais, tudo como fora peticionado.

XXIV - Daí que, em função do exposto e do mais de direito aplicável, será de julgar procedente o presente recurso jurisdicional e por via disso de revogar parcialmente a sentença, declarando-se a integral procedência dos pedidos formulados na acção pelo Ministério Público” .

Contra-interessada, INTERMEGA, contra-alegou, concluindo do modo que segue:
I.A reversão em causa reveste um carácter meramente formal, como forma encontrada pelas partes para dar expressão à alteração do alvará.
II. A alteração ao alvará regia-se ao tempo por norma diversa da pura reversão, ou seja, pelo disposto no art°36° do DL n°448/91.
III. Ainda que assim não fosse não se verificaria nulidade, mas mera anulabilidade.
IV. Em consequência o direito de acção havia caducado.
V. A compra e venda entre C...e I...é negócio de natureza privada do direito civil, não susceptível de ser apreciada pelos Tribunais Administrativos, face ao disposto no art°4° do ETAF.
VI. Além do mais verifica-se a existência de caso julgado que ordenava a alteração ao alvará e a reversão.
VII. Nestes termos o recurso interposto pelo Digno representante do M° Público não poderá proceder.
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RECURSO DA CONTRA INTERESSADA – INTERMEGA, limitado à parte em que foi declarada a nulidade da deliberação camarária, de 22.04.1998, que aprovou a alteração ao alvará de loteamento.

A INTERMEGA, apresentou na sua alegação, as seguintes conclusões:
1a) A deliberação da C.M.C, de 22.4.1998 que aprovou o pedido de alteração ao alvará de loteamento n°708/84 é inteiramente válida, porquanto admitida nos termos do art°36° do DL n°448/91, de 29.11 (então em vigor) - V. doutrina referida no ponto 11 das presentes alegações.
2a) Da concatenação do disposto nos art°s28°, 29°, al. f) e 36° do referido DL n°448/91, resulta que os pedidos de alteração de alvarás de loteamento podem incidir sobre todas as especificações do alvará respectivo, incluindo a alteração das áreas de cedências;
3a) Foi o que aconteceu no caso dos autos: a alteração requerida e aprovada visou a constituição de mais lotes para construção e a redução das áreas cedidas ao Município de Cascais (de 37.068 m2 para 29.741,30 m2);
4a) Toda a solução jurídica do pleito reside nesta questão - aplicação do regime específico das alterações aos alvarás de loteamentos, previsto pelo art°36° do DL n°448/91, de 29.11;
5a) A douta sentença não se pronunciou sobre esta questão e antes submeteu os factos ao regime da reversão pura previsto nos art°s 16º e 17° do mesmo DL n°448/91;
Por outro lado,
6a) Considerou-se na d. sentença recorrida que a deliberação camarária em causa é juridicamente impossível por violar o disposto no referido art° 17°, facto que acarretaria a sua nulidade, de acordo com o disposto nos art°s 133°, n° 2, al. c) do CPA;
7a) A única coisa (sem conceder) que poderia dizer-se é que a deliberação violou o disposto no referido art°17°, mas o objecto da mesma nada tem de impossível quer do ponto de vista físico quer jurídico;
8a) Impossibilidade jurídica não se confunde com ilegalidade, como é sabido, sendo certo que quanto muito no caso se poderia falar de violação do disposto no referido art°17° (facto que apenas traduziria o vício da violação da lei) o que gera a mera anulabilidade e não a nulidade;
Ora,
9a) O acto administrativo ferido pelo vício de violação da lei, gerador da anulabilidade, só pode ser posto em crise dentro do prazo previsto para a sua impugnação - 1 ano para o M° P°, cfr. art°58° do CPTA;
10a) Sucedendo, como sucede, que a "impugnação" só foi feita pela presente acção, passado muito mais do que um ano, o acto em questão se encontra convalidado;
Acresce que,
11a) A d. sentença recorrida deixou também de se pronunciar sobre dois casos julgados, alegados pela recorrente e os quais colidem com a declaração de nulidade efectuada;
12a) Uma das sentenças cfr. consta dos autos - doc. 2 junto com as alegações na 1a instância - intimou a C.M.C, para emitir a referida alteração ao alvará;
13a) A outra – doc.1 junto igualmente com as referidas alegações - foi mais longe:
- apreciou o objecto da lide e da transacção, o qual julgou possível e na disponibilidade das partes, condenando estas nos precisos termos da transacção;
14a) Sendo certo que a transacção obrigava as partes, designadamente a C.M.C., a efectuar a reversão e a aprovar a alteração ao alvará em questão;
15a) O próprio M° P° concordou com a transacção pelo que se questiona a sua legitimidade na presente acção (questão esta também omitida pela d. sentença recorrida);
16a) No demais damos por inteiramente reproduzidas as Conclusões do d. Parecer que se anexa.
17a) Assim, se requer a esse Vo Tribunal que, atendendo ao exposto, designadamente colmatando as faltas de pronúncia supra referidas (geradores, aliás, de nulidade) nos termos do n° 1 do art° 149° do CPTA, revogue a douta sentença recorrida, na parte afectada e a que se cinge o presente recurso, ou seja, na parte em que se declarou a nulidade do acto da C.M.C, de 22.4.1998 e, em consequência, julgue a presente acção totalmente improcedente”

O Ministério Público, contra-alegou, terminando do modo que segue:
I- O artigo 36° do DL. 448/91 consagra como que um princípio geral de alteração dos alvarás de loteamento.

II- Apesar da possibilidade de alteração dos alvarás de loteamento ter um alcance prático inquestionável, também constitui um dos grandes males que afecta o regime de loteamento do nosso país, pois que se tal alteração não for devidamente acautelada, pode pôr em causa todo o quadro legal que regula o urbanismo e causar graves prejuízos ao interesse público em geral e a terceiros de boa fé, designadamente adquirentes de outros lotes, que por força dessa alteração, podem ver frustradas as suas expectativas, quanto ao espaço envolvente.

III- Daí que tais alterações tenham de ser muito criteriosas, para o que contribuem as limitações legais, contidas designadamente nos artigos 36°n.º3 e 17° do DL 441/98.

IV- Assim, o artigo 17° do citado DL. 448/91, constitui uma excepção à regra da alterabilidade dos alvarás de loteamento, consagrada no artigo 36° do mesmo diploma, impedindo, portanto, a alteração desse alvará no que diz respeito às finalidades, quando esteja em causa parcela de terreno anteriormente cedida ao domínio público.

V- Consequentemente, esta regra constitui um impedimento intransponível às alterações da finalidade de parcela de terreno que foi cedida ao domínio público municipal e depois revertida.

VI- Portanto, nestas circunstâncias, a parcela de terreno tem de manter a finalidade a que estava afecta, por imperiosas razões de interesse público, ou seja o respeito pelo quadro legal que regula o urbanismo e, consequentemente, o interesse público que aquele quadro visa proteger.

VII- Esta imposição visa ainda acautelar os interesses e expectativas dos terceiros de boa fé que tenham adquirido lotes de terreno na convicção de que determinadas áreas de loteamento afectas a determinados fins pelo alvará, (espaços verdes, espaços de recreio ou outros espaços para infra-estruturas) permaneçam inatacáveis.

VIII -Assim, o referido artigo 17° torna impossível, sob o ponto de vista jurídico, que se afectem parcelas cedidas ao sector pública e posteriormente revertidas para o sector privado sejam afectas a fins diferentes daqueles a que se destinavam.

IX- Consequentemente o acto impugnado ao titular uma situação jurídica impossível é nulo, nos termos da alínea c) do n°2 do artigo 133 do CPA, termos em que bem andou a decisão ora em apreço, quando declarou nulo o acto de 22.04.1998, termos em que deve ser mantida, sob pena de violação do citado artigo 17° do DL. 448/91.

X -Caso assim se não entendesse, o que se admite por mera cautela, ou seja, se se admitisse que estava em causa apenas um vício de violação da lei, determinante da anulabilidade do acto, porque se trata de acto cuja publicação é obrigatória, e o recorrente, que invoca a excepção da extemporaneidade, não fez prova da publicação do acto, a presente acção sempre teria de se considerar tempestiva.

XI - O caso julgado pressupõe a existência de duas acções idênticas, ou seja, pressupõe a identidade de sujeitos, de pedido e de causa de pedir.

XII -Tal situação não se verifica entre a presente acção e aquelas que estão em causa nos processos n°s 819/2001 273/05 2BENST que correram termos no TAC de Lisboa.

XIII -Com efeito, trata-se de acções com sujeitos, pedido e causa de pedir diferentes, em que não foi objecto de apreciação, nem podia ser, a questão material relacionada com a validade da deliberação de 22.04.1998, nem tão pouco a validade da alteração do alvará de loteamento.

XIV- Termos em que bem andou a decisão recorrida ao desconsiderar tais decisões, na apreciação dos factos objecto destes autos.

XV- Por tudo quanto fica exposto, a decisão ora recorrida ao declarar a nulidade da deliberação de 22.04.1998, fez uma correcta interpretação dos factos e aplicação da lei, pelo que, neste segmento, deve ser mantida nos seus precisos termos.

Em 19.01.2006, foi proferido despacho de sustentação (cfr. fls. 397/399).
Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.
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2. FUNDAMENTAÇÃO:

2. 1 DOS FACTOS

A decisão recorrida deu com assente, e, com interesse para a decisão, a seguinte factualidade:
“1º
A Cooperativa "C...- Cooperativa de Habitação Económica dos Trabalhadores do Estoril - Sol, CRL.", com sede na Aldeia do Juzo, em Cascais, tinha inscrito, em 17 de Novembro de 1982, a seu favor um prédio para construção, composto por várias parcelas de terreno com a área total de 60.930m2, sito na referida Aldeia do Juzo, freguesia e concelho de Cascais, parcelas descritas na competente Conservatória do Registo Predial sob os números 945, da 13 Secção, a fls. 142 do Livro B-28, 17600, da mesma Secção, a fls. 6v, do Livro B-52, e 17601, também da mesma Secção, a fls. 7 do Livro B-52, 8961, a fls. 38, do Livro 8-27, 21258, a fls. 15vo do Livro B-63, 4118, a fls. 83 do Livro B-12, e 15567, a fls. 20 do , Livro 8-46, e inscritas na matriz predial da Freguesia de Cascais sob os artigos 357,466,424,359 e 355, todos da Secção 35 (Cfr. fls. 10 a 15);.

Em 07.10.1976 a C...requereu ao Presidente da Câmara Municipal de Cascais a aprovação de operação de loteamento urbano para as indicadas parcelas de terreno, para divisão em lotes individuais e posterior construção de edifícios destinados à habitação. (Cfr. Acordo e fls. 16);

O pedido de licenciamento seguiu a tramitação de acordo com o regime legal então em vigor (DL 289/73, de 6 de Junho (Acordo)

A operação de loteamento urbano veio a ser aprovada por despacho datado de 17 de Novembro de 1977, da autoria do Presidente da Câmara Municipal de Cascas, na sequência de prévio parecer das então Direcção-Geral dos Serviços de Urbanização, Direcção-Geral das Construções Escolares e Junta Autónoma de Estradas, o que determinou a divisão do prédio em 200 lotes de terreno para construção urbana. (Cfr. acordo e fls. 17);

Por despacho de 10 de Novembro de 1982, o Presidente da Câmara Municipal de Cascais deferiu o pedido de concessão de alvará de loteamento em favor da cooperativa, e dele resultou a cedência em favor do Município de uma área de 37.068m2. (Cfr. acordo e fls. 17);

Foi outorgada, em 13 de Janeiro de 1983, no edifício dos Paços do Concelho da Vila de Cascais, a escritura de doação mediante a qual a C...fez doação irrevogável ao Município de Cascais da área total de 37.068m2, constituída por três parcelas de terreno, que assim se integraram no seu domínio público. (Cfr. acordo e fls. 18 a 23);
7a
Em 18 de Dezembro de 1984, foi emitido em favor da sociedade cooperativa C...o alvará de loteamento com o nº708/84, no qual se referencia que a titular do alvará cedeu ao Município três parcelas de terreno:
a) - uma com 12.130m2, destinada a armamentos.
b) - uma outra com 3.900m2, destinada a edifício escolar.
c) - uma outra ainda com 21 .038m2, destinada a zonas livres (parque). (Cfr. fIs. 24 e 25);
8a
Em 9 de Janeiro de 1998, e por proposta apresentada pelo Presidente da Câmara, a Câmara Municipal deliberou por unanimidade aprovar a proposta de "... reversão das parcelas de terreno respeitante aos lotes cuja constituição será autorizada na operação de loteamento, com a área e confrontações definidas; na planta n°7, constante do processo de loteamento" (Cfr. confissão e fIs. 26 a 32)
9a
Mediante a referida deliberação, foi aprovada a reversão a favor da Contra -interessada C...das parcelas de terreno que por via do alvará nº 708/84 haviam sido cedidas para o Município de Cascais. (Cfr. acordo);
10º
Em 28 de Agosto de 1997 a C...requereu a alteração do alvará nº 708/84, com vista à divisão em mais lotes, para construção. (Cfr. acordo e fls. 33).
11º
A alteração ao alvará de loteamento foi aprovada na reunião da Câmara Municipal de Cascais de 22 de Abril de 1998, prevendo a constituição dos pretendidos lotes de terreno. (Cfr. acordo e fls. 34 a 36);
12º
O Deliberado resultou de proposta apresentada pelo Presidente da Câmara Municipal, nela se considerando os pareceres favoráveis emitidos pelos serviços municipais constantes do processo, e bem assim a autorização de 2/3 dos proprietários dos lotes que integravam o loteamento 708/84, autorização essa anexa à deliberação de 09-01-98. (Cfr. acordo e fls. 37);
13º
Em reunião da Câmara Municipal de Cascais de 29 de Julho de 1998, e como aditamento à deliberação de 9 de Janeiro de 1998, foi de novo aprovada sob a forma de aditamento à proposta de reversão de três parcelas de terreno, com indicação precisa, das áreas e descrição predial das mesmas, sendo as áreas a reverter inferiores às que anteriormente haviam sido cedidas ao Município. (Cfr. acordo e fls. 40 e 41);
14º
O Aditamento consubstanciou-se em:
a) uma parcela com a área de 2.517,70m2, a desanexar da descrição nº28.650, fls. 1 verso do Livro B-112 (cedida para escola).
b) uma parcela com a área de 1.318,35m2, a desanexar da descrição no 28.649, fls. 100 do Livro B 111 (cedida para arruamentos)
c) uma parcela com a área de 3.490,65m2, a desanexar da descrição no 28.651, fls. 2 do Livro B-112 (cedida para parques e zona de lazer).
Tudo perfazendo uma área total de 7.326, 70 m2 . (Cfr. acordo e fls. 40);
15º
Em 5 de Agosto de 1998 foi celebrada escritura notarial de reversão, mediante a qual o Município de Cascais transferiu para a C...a propriedade das três parcelas de terreno, indicadas, que se integraram no respectivo património. (Cfr. acordo e fls. 42 a 45);
16º
Em 05.08.1998 a Contra-interessada "I...- Gestão e Comércio de Produtos, Lda., subscreveu escritura e compra e venda com a Chesol, das parcelas que haviam revertido para esta. (Cfr. acordo e fls. 46 a 50)
17º
A I...procedeu ao registo das parcelas adquiridas na Conservatória de Registo Predial (Cfr. acordo e fls. 52 a 65 ) e
18º
e requereu o averbamento em seu nome do loteamento n.º708/84, o que foi autorizado (Cfr. acordo e fls. 66 a 71);
19º
O Aditamento ao Alvará veio a ser emitido em nome da Intermega. (Cfr. aordo e fls. 66 a 71);
20º
Em 26 de Maio de 2003 o Ministério das Cidades e do Ordenamento do Território e Ambiente envia à CMC relatório parcial de inquérito relacionado com o alvará nº 708, no qual se refere:
1ª O licenciamento da operação de loteamento inicial, na medida em que se processou à revelia dos pareceres técnicos emitidos, designadamente pela ex-D.G.S.U., culminando com a estipulação expressa no alvará nº 708, emitido aos 84.12.18., de índice de ocupação superior ao determinado por aquela entidade é, de acordo com a legislação ao tempo aplicável, nulo e de nenhum efeito.
2ª Assim sendo, são merecedoras de censura as condutas adoptadas pelos autores dos despachos presidenciais licenciadores exarados em 77. 11. 17, 79.01.15. e dos despachos presidenciais licenciadores exarados em 77.11.17., 79.01.15. e 82.11.10., sendo certo, porém, que o decurso do tempo não nos permite propor qualquer medida de carácter sancionatório - tutelar.
3ª Acresce que, apesar dos serviços camarários da área do património terem desde início, alertado para o facto da pretensão ocupar domínio municipal, designadamente caminho público e artigo cadastral nº358, constatou-se que, nem os aludidos despachos presidenciais, nem a deliberação camarária tomada aos 84.02.27., contiveram a aprovação do loteamento, encontrando-se, ainda hoje, lesado o interesse público, porquanto, se verifica a existência de edificação em, pelo meros, parte de quatro lotes no aludido caminho.
4- Quer nas negociações empreendidas no âmbito do Proc.º n.º53/93, tramitado na 2.a Secção do T.A.C, de Lisboa, quer na proposta da solução encontrada para por termo ao referido litígio, intervieram apenas dois consultores jurídicos e advogados avençados da C.M.C., não se descortinando, para além do então edil Presidente, quaisquer outras participações, designadamente dos restantes elementos do Grupo de Trabalho, criado por aquele último em 94.03.24..
5ª Tal solução, culminando em 98.02.25., com a homologação judicial da transacção em sede do aludido Procº nº 593/93, envolveu prévio acordo de intenções outorgado pelo então Presidente da CMC. e pela sociedade Altamente, Lda., dele resultando o compromisso de aprovação pelo órgão executivo de alteração ao alvará de loteamento n.º708/84, mediante a reversão de parcela, anteriormente cedida pela Chesol, no âmbito daquela intervenção urbanística, por alegado desvio de finalidade pública de cedência.
Não obstante, à data da outorga do acordo supra - 96.11.11, carecesse a aludida parcela de intervenção da Comissão de Avaliações, bem como, de enquadramento em termos de P.D.M., a C.M.C., por deliberação unanimemente tomada em 98.01.09. aprovaria a proposta presidencial de reversão daquela parcela para a Chesol.
6ªNo que concerne, ao aditamento ao alvará do loteamento inicial, constatou-se que, por via dos comportamentos omissivos, dos serviços de urbanismo e de um dos consultores jurídicos avençados, não se procedeu como devia, em sede de saneamento, ao indeferimento liminar do processo, face ao desrespeito pelo legalmente cominado em matéria de 2/3 dos proprietários dos lotes, logrando o mesmo diferimento, camarário em 98.04.22. e presidencial aos 99.07.28.
7ª Acresce que, apesar dos serviços patrimoniais da C.M.C, terem alertado, desde início, para a situação da pretensão englobar terreno do domínio privado municipal, o certo é que, salvo no que respeita a 1.100,30m2, nele inseridos, posteriormente alienados pelo Município à C...pelo valor de 1.000/m2 e à revelia da Comissão de Avaliações, o remanescente do aludido terreno, artº cadastral nº 358, permanece indevidamente incluído no perímetro do aditamento, circunstância que determina a invalidade dos referidos licenciamentos.
Em face do descrito, superiormente se alvitra que sejam tornadas as seguintes medidas:
1ª Participação ao Digno Magistrado do M. P. junto do T.A. C. de Lisboa dos factos descritos..." (Cfr. fls. 109 a 1 12);
21º
Em 29 de Maio de 2003 o Presidente da Câmara Municipal de Cascais prefere o seguinte despacho:
"Em 26 de Maio de 2003, através do ofício n°3948/03 da IGAT, foi dado conhecimento à Câmara Municipal de Cascais das conclusões do Inquérito ao Município de Cascais, que incidiu sobre o assunto acima referenciado, no qual se refere:
Do parecer final, homologado por Sua Excelência o Ministro das Cidades, Ordenamento do Território e Ambiente em 23 de Maio de 2003, resulta a remessa ao Ministério Público de cópia do relatório, para efeitos de declaração de nulidade das deliberações de Câmara 09.01.98 e 28.07.99, que aprovaram a alteração ao alvará de loteamento nº708.
A gravidade dos factos, enumerados na síntese conclusiva do relatório apontam no sentido da forte probabilidade dos actos que estiveram na base da emissão do Aditamento ao Alvará de loteamento em 8 de Janeiro de 2002 serem declarados nulos.
A prossecução dos trabalhos face às circunstâncias descritas afigura-se-nos de difícil ou impossível reparação, a confirmar-se a declaração de nulidade.
Atento o interesse público em causa e a situação de irreversibilidade que poderá ser criada a curto prazo, obriga a uma actuação no âmbito das suas competências.
Assim, determino, ao abrigo do disposto no nº2, do artigo 150º do Código do Procedimento Administrativo, suspender a eficácia do Aditamento ao alvará de loteamento n.º 708 em 8 de Janeiro de 2002, com a consequente suspensão dos trabalhos em curso". (Cfr. fls. 106);
22º
Em 30 de Maio de 2003, é enviada, por parte da CMC, notificação ao Administrador da Sociedade Intermega, onde se refere:
"... ao abrigo do disposto no nº2, do artigo 150° do Código do Procedimento Administrativo, suspender a eficácia do Aditamento ao alvará de loteamento nº 708 em 8 de Janeiro de 2002, com a consequente suspensão dos trabalhos em curso". (Cfr. fIs. 114);
23º
O Administrador da I...tomou conhecimento da notificação em 30 de Maio de 2003 (Cfr. fls. 114)”
*
Quanto aos factos provados a convicção do Tribunal baseou-se nas peças processuais e nos documentos constantes dos autos e do Processo Administrativo apenso.
*
Não se provaram quaisquer outros factos passíveis de afectar a decisão de mérito, em face das possíveis soluções de direito, e que, por conseguinte, importe registar como não provados.
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2.2. – DA APLICAÇÃO DO DIREITO AOS FACTOS

Vem interposto dois recursos jurisdicionais do acórdão de fls.259 e seg., -um pelo Ministério Público, junto do TAF de Sintra pugnado pela revogação da decisão na parte em manteve a deliberação da C.M. de Cascais de 09.01.1998 que aprovou a reversão em favor da contra-interessada C...de três parcelas de terreno que esta doara por escritura pública de 13.01.1983; a deliberação de 29.07.1998, que em aditamento à anterior desanexou de parte daquelas parcelas as áreas descritas no artigo 14º da matéria assente; confirmou o contrato de reversão outorgado em 05.08.1998 a favor da contra–interessada C...bem como o contrato de compra e venda, da mesma data, mediante o qual contra -interessada I...adquiriu as parcelas de terreno objecto da reversão celebrada – e o outro pela Contra-Interessada Intermega, na parte em que anulou a deliberação camarária de 22.04.1998 que aprovou a alteração ao alvará de loteamento n.º704/84,” prevendo o parcelamento em mais lotes de terreno para construção numa área que fora de cedência para domínio público municipal”.

Recurso do Ministério Público
Na sua alegação, e respectivas conclusões, o Ministério Público defende, desde logo, a nulidade das deliberações de 09.01.98 e 29.07.98 da autoria da CM de Cascais, mediante as quais esta edilidade aprovou a reversão dos terrenos cedidos pela contra-interessada Chesol, no âmbito da operação de loteamento titulado pelo alvará n.º 708/84 e, consequentemente a nulidade dos contratos delas dependentes, ambos datados de 05.08.98, por via dos quais ocorreu uma transferência sucessiva do direito de propriedade em favor da C...e da Intermega.
Alega, aliás, que a nulidade das deliberações camarárias advém do facto de não ter ocorrido desvio algum à finalidade pública da cedência, pois que os terrenos cedidos mantinham a mesma função, de “zona verde não tratada “que tinham quer à data da aprovação da aprovação do loteamento quer à data em que foi emitido o acto a autorizar a reversão dos mesmos terrenos. Dito por outras palavras, no entender do recorrente, MP, não se verificavam os pressupostos fixados nos n.º 3 e 4 do artigo 16º do DL n.º 448/94, de 29.11. para que houvesse direito à reversão dos terrenos doados pela contra -interessada Chesol, em 13.01.1983, no âmbito do operação de loteamento urbano que veio a ser titulada pelo alvará de loteamento n.º708/84, a seu favor.
Vejamos então.
Resultava do artigo 16º do DL n.º 448/91, sob a epígrafe “Cedências “ e, no que aqui releva, o seguinte regime legal: “ (…) 3- As parcelas de terreno cedidas à câmara municipal integram-se automaticamente no domínio público municipal com a emissão de alvará e não podem ser afectas a fim distinto do previsto no mesmo, valendo este para se proceder aos respectivos registos e averbamentos.
4- O cedente tem direito de reversão sobre as parcelas cedidas nos termos dos números anteriores sempre que haja desvio da finalidade da cedência, aplicando-se com as necessárias adaptações, o disposto quanto à reversão no Código das Expropriações. (…)” .
E apesar da doação dos terrenos, agora objecto de pedido de reversão, ter ocorrido na vigência do Código das Expropriações, aprovado pelo DL n.º845/76, de 11.12, que não previa a possibilidade de reversão a favor dos particulares quando o expropriante fosse entidade de direito público, só o admitindo a favor das autarquias (artigo 7º, n.º1). Ora, o Acórdão do TC no seu acórdão n.º 827/96, de 26.06.1996, proferido no processo n.º726/92 - publicado no DR, II Série, n.º 53 de 04/03/1998, págs. 2776 e segs.- veio a julgar inconstitucional o art. 7.º, n.ºs 1 e 3 do Código das Expropriações de 1976, respectivamente, “por violação do artigo 62.º da Constituição” e por “violação dos artigos 268.º, n.º 3 e 20.º da Constituição”.
Idêntico entendimento sufragou o STA, como se pode ver nos Acórdãos do Pleno de 27.05.1999,Rec. n.º 30230; de 06.02.2002, Rec. n.º 35272 e de 06.03.2007 e das Secções onde se salienta, por todos, o proferido no Rec. n.º 28463, de 24.09.1992, onde este Venerando Tribunal considerou e ponderou "(...) o direito de reversão é (...) uma decorrência do direito de propriedade; não podem, pois, ser estabelecidas restrições ao primeiro que representem restrições ao segundo, muito menos quando incluídas no respectivo conteúdo.
(...) certo é que o legislador é livre de, em cada momento lhe dar o conteúdo e a finalidade que entender adequados, mas não pode o legislador ordinário ir ao ponto de estabelecer uma regulamentação que neutralize ou contrarie direitos que o legislador constitucional garante. ".
E, após recordar que o n.°1 do artigo 62.° da CRP garante o direito à propriedade privada e o n.°2 impõe que a expropriação por utilidade pública só com base na lei se efectue, prossegue: "É manifesto que "a lei" com base na qual a expropriação pode ser efectuada tem que respeitar os parâmetros da expropriação por utilidade pública; daí que também não por essa lei (ordinária) conter mecanismos que invalidem ou contornem a exigência de que a expropriação tenha essa mesma utilidade pública. E há que reconhecer que esse é o caso do artigo 7.° n.° 1 CE, ao excluir a reversão, no caso de a entidade expropriante ser de direito público, quando o expropriado seja uma pessoa jurídica de direito privado."
Tal entendimento foi acolhido, como se viu, pelo Tribunal Constitucional, que, em recurso interposto dessa decisão, proferiu o acórdão 827/96, de 26/96, julgou inconstitucional o n.° 1 do artigo 7.° do Código das Expropriações de 76 (CE/76), expendo ainda que “(…) impõe-se recusar aqui, com igual fundamento, a aplicação da norma e afastado o obstáculo legal ao reconhecimento do direito de reversão do particular quando o expropriante seja entidade de direito público, aceitar que os recorrentes eram titulares desse direito já na vigência do Código das Expropriações de 76.”.E, pelos mesmos fundamentos temos por desaplicado o n.º3 do artigo 7º do CE/76, o que conduz, - como foi entendido no Acórdão do Pleno do STA, de 2007- a que “…no domínio do Cód. das Expropriações/76 [deixou ] de estar previsto um prazo dentro do qual o direito devesse ser exercido …”.
Ninguém questiona a jurisprudência pacifica e uniforme do STA que reiteradamente tem entendido, no tocante às expropriações feitas no domínio do CE/76, - por se não poder atender ao prazo previsto no art. 7.º- , que a entidade expropriante dispunha de dois anos, após a entrada em vigor do CE/91 (07/02/1992), para aplicar o bem expropriado aquele fim que esteve na origem da expropriação e que só depois de decorrido este prazo sem que a entidade expropriante aplicasse esse bem aquele fim é que assistia ao particular o direito de reversão (cfr., entre outros, os acórdãos do STA (Pleno) de 21.03.2003 - Proc. n.º 042031, de 12.04.2005 - Proc. n.º 044300, de 22.06.2006 - Proc. n.º 048319, de 06.0./2007 - Proc. n.º 030256; acórdãos do STA (Secção) de 27/10/2004 - Proc. n.º 01438/03, de 09/02/2005 - Proc. n.º 030256, de 05/04/2005 - Proc. n.º 01386/02).
Dispunha, o artigo 5º do DL n.º 438/91, de 09.11- vulgo Código das Expropriações de 1991 (CE/91), sob a epigrafe “Direito de reversão“ o seguinte:
“ 1- Há direito de reversão se os bens expropriados não forem aplicados ao fim que determinou a expropriação no prazo de dois anos após a adjudicação ou, ainda, se tiver cessado a aplicação a esse fim, sem prejuízo do disposto no n.º 4.
2 - (…).
3 - (…).
4 - O direito de reversão cessa:
a) Quando tenham decorrido 20 anos sobre a data da adjudicação;
b) Quando seja dado aos bens expropriados outro destino, mediante nova declaração de utilidade pública;
c) Quando haja renúncia expressa do expropriado.
5 - No caso da alínea b) do número anterior, o expropriado ou demais interessados podem optar pela fixação de nova indemnização ou podem requerer no processo anterior a revisão da indemnização com referência à data da efectivação da nova aplicação dos bens, nos termos do artigo 23.º, aplicando-se, com as devidas adaptações, em caso de divergências sobre o valor da nova indemnização ou da revisão da anterior, o disposto nos artigos 37.º e seguintes.
6 - A reversão deve ser requerida no prazo de dois anos a contar da ocorrência do facto que a originou, sob pena de caducidade, sem prejuízo de assistir ao expropriante, até ao final do prazo previsto na alínea a) do n.º 4, o direito de preferência na alienação dos bens para fins de interesse privado.
7 - O acordo entre a entidade expropriante e o expropriado ou demais interessados sobre outro destino a dar ao bem expropriado e o montante do acréscimo da indemnização que resultaria da aplicação do disposto no n.º 5 vale por renúncia ao direito de reversão.
8 - Se a entidade expropriante pretender alienar parcelas sobrantes, deverá comunicar a sua intenção ao expropriado e demais interessados, desde que todos sejam conhecidos, por carta registada com aviso de recepção, com a antecedência mínima de 90 dias, findos os quais, não tendo estes requerido a reversão, se entende que renunciaram ao correspondente direito.”.
Tendo presente este enquadramento legal cabe, pois, analisar a arguida nulidade das deliberações da CM de Cascais, de 09.01.1998 e de 29.07.1998.
Segundo a tese do recorrente, MP, a C...não teria direito à reversão por não se ter demonstrado que as três parcelas de terrenos doadas em 1983, tinham sido afectas a fins diversos daqueles que motivaram a sua cedência, pois que essa área de terreno se mantinha tal qual como tinha sido cedida, isto é, como uma “ zona verde não tratada”.
Deu o acórdão recorrido como provado (artigos 5º a 7º do probatório) que as três parcelas de terreno cedidas no âmbito da operação de loteamento titulado pelo alvará n.º 708/84, com uma área de 37.068m2, foram destinadas para arruamentos, para a construção de um edifício escolar e para parques e zona de lazer. Porém, durante o período que mediou a cedência desses bens à CM de Cascais e o pedido de reversão da Contra-Interessada Chesol, aqueles terrenos mantiveram-se, utilizando a expressão do recorrente, como “zonas verdes não tratadas”, ou seja, não foram afectados nem aos fins para que tinham sido cedidos nem a quaisquer outros. E, nem se diga, como parecer quer ver o recorrente, MP, que para se operar a reversão era necessário ter existido da parte da edilidade “um comportamento activo” que se traduza numa afectação para fim diverso daquele que motivo a cedência não ocorrendo direito de reversão quando os prédios não foram afectados a qualquer fim. Tal entendimento significaria a negação do direito de reversão, porque só quando se utilizasse o bem para fim diverso daquele que determinou a sua cedência/expropriação é que o particular poderia lançar mão do instituto da reversão.
Ora, no caso dos autos ficou provado que os terrenos cedidos à CM de Cascais em 1983, não foram afectos, ou, usando a terminologia do CE/91, (artigo 5º) aplicados ao fim que determinou a sua cedência, e assim sendo, como o foi, assistia ao Contra-Interessado C...o direito a pedir a retrocessão dos bens doados no âmbito da operação de loteamento titulado pelo alvará n.º 708/84.
Sustenta ainda o recorrente que, caso houvesse direito à reversão, este direito já tinha caducado, quando a 02.10.1996 a Contra-interessada C...veio pedir à CM Cascais a devolução das parcelas de terrenos anteriormente cedidas.
Para apreciar e decidir a questão posta ao veredicto do tribunal convém precisar certos conceitos.
O instituto da “caducidade” por via do qual os direitos potestativos se extinguem por efeito do seu não exercício durante certo tempo, tem como seu fundamento específico a necessidade da certeza jurídica, isto é, o interesse público de que, decorrido certo prazo, fique definida a situação jurídica das partes.
Ora dispõe o art. 329.º do Código Civil que:
“O prazo de caducidade, se a lei não fixar outra data, começa a correr no momento em que o direito puder legalmente ser exercido.”
E decorre do art. 330.º, n.º 1 do mesmo código que:
“São válidos os negócios pelos quais se criem casos especiais de caducidade, se modifique o regime legal desta ou se renuncie a ela, contanto que não se trate de matéria subtraída à disponibilidade das partes ou de fraude às regras legais de prescrição”.
O instituto da caducidade tem pôr fundamentos vectores como a certeza e a ordem pública, vistos no sentido de que é necessário que, ao fim de certo lapso de tempo, as situações jurídicas se tomem certas e inatacáveis. Esta prevalência de considerações de ordem pública constitui a razão explicativa para que o prazo de caducidade corra sem suspensões e interrupções e, em princípio, que só o exercício do direito durante o mesmo impeça que a caducidade opere. Refere-se, ainda, que a caducidade determina a extinção do direito e da correspondente vinculação sem mais, não gerando o consequente aparecimento de uma obrigação natural, contrariamente ao que acontece com o instituto da prescrição. Por último, a caducidade deve consubstanciar-se como uma excepção peremptória passível de apreciação oficiosa pelo tribunal (cfr.ait°s.328, 331 e 333, todos do C.Civil; art°.496, do C.P.Civil; Luís A. Carvalho Fernandes, Teoria Geral do Direito Civil, II, A.A.F.D.L, 1983, pâg. 567 e seg.; Canos Alberto da Mota Pinto, Teoria Geral do Direito CM1, Sa.ediçâo, Coimbra Editora, 1989, pág.372 e seg.).
Acresce que, conforme definição dada pelo Prof. Cabral de Moncada referido no Ac. do STA de 25/11/98, Recurso nº 34.284, a caducidade "é o termo natural da eficácia dos direitos em virtude de ter chegado o seu limite máximo de duração ", contrariamente ao que acontece na prescrição em que "o que determina a extinção do direito é o seu não uso ou não exercício por certo tempo "; "na prerempção (caducidade) é o seu simples chegar ao fim do tempo previamente fixado para o seu exercício, quer este tenha tido lugar ou não ".
E, como se expende ainda no citado aresto, "a caducidade não se suspende, porque o seu fundamento puramente objectivo (correr ou não correr o tempo), tanto faz que o titular esteja, como não esteja, em condições de poder exercer o direito "(...) não pode "...interromper-se a perempção, pela simples razão de que aqui já não há, por parte da lei, presunções a estabelecer, nem negligências a castigar e visto que o tempo na sua jurídica objectividade nunca se interrompe. Uma interrupção no tempo seria um salto na eternidade ".
Ora, na situação em apreço, em que não houve qualquer aplicação do bem ao fim para que foi cedido, o que é relevante para apreciar se ocorreu o direito de reversão é saber se o direito de reversão foi exercido no período de dois anos referido no n.º 1 do artigo 5 do CE/91, sem que tal aplicação ocorresse. Este prazo, relativamente a prédios cedidos/expropriados antes da entrada em vigor do Código das Expropriações aprovado pelo Decreto-Lei n.º 438/91, de 13 de Novembro, deve ser contado a partir da entrada em vigor deste Código.
A este propósito referiu o Prof. F. Alves Correia que “… Subjacente à posição da aplicabilidade da reversão, condensada no n.º 1 do artigo 5.º do Código de 1991, às expropriações cujo acto de declaração de utilidade pública foi publicado no âmbito temporal de eficácia do Código anterior e em que foi adjudicada a propriedade dos bens expropriados também no domínio deste Código, está o entendimento da expropriação como uma «situação de trato sucessivo», isto é, como uma relação jurídica que não finda ou não se consuma enquanto a entidade expropriante não tiver aplicado os bens expropriados ao fim público específico que justificou a expropriação e, caso não tenham sido aplicados a esse fim, enquanto for possível requerer a reversão, nos termos e nos prazos fixados nos artigos 5.º e 70.º a 75.º do Código das Expropriações. Daí que a expropriação configure uma situação que cai na alçada de aplicação da segunda parte do n.º 2 do art. 12.º do Código Civil, ou seja, uma daquelas hipóteses em que a lei norma (in casu, o Código das Expropriações de 1991) define o conteúdo ou os efeitos de certas relações jurídicas, independentemente dos factos que lhe deram origem, sendo, por isso, de aplicação imediata, abrangendo as relações jurídicas constituídas e subsistentes à data da sua entrada em vigor …” [cfr. anotação ao Acórdão de 19/01/1995 - Proc. n.º 31.995 in: CJA, n.º 0, págs. 49 e segs.; vide ainda do mesmo Autor “As Grandes Linhas da Recente Reforma do Direito do Urbanismo Português” - reimpressão, págs. 71 a 73, nota 52].
Ponderou –se no Ac. do Pleno do STA de 12.04.2005, rec. n.º 44300, que com a devida vénia se transcreve: “ (… ) o reconhecimento do direito de reversão pelo Código das Expropriações de 1991 deve ser considerado como fixando um prazo para afectação do bem ao fim da expropriação, que não existia anteriormente.
Assim, à aplicação no tempo daquele art. 5.º, n.º 1, do Código das Expropriações de 1991, deve aplicar-se a regra do n.º 1 do art. 297.º do Código Civil, que estabelece que a lei nova que estabelecer um prazo mais curto que o previsto na lei anterior deve aplicar-se imediatamente aos prazos em curso, mas o prazo só se conta a partir da entrada em vigor da lei nova. Esta norma relativa à lei nova que encurta um prazo, aplica-se, por paridade de razão, à lei nova que vem introduzir um prazo para a prática de determinado acto, que não existia na lei anterior. (Neste sentido, pode ver-se BAPTISTA MACHADO, Introdução ao Direito e ao Discurso Legitimador, página 243, e Sobre a aplicação no tempo do novo Código Civil, páginas 164-165.)
Nestes termos, o facto que pode gerar o direito de reversão é o decurso do prazo de dois anos a contar da entrada em vigor do Código das Expropriações de 1991, sem que fosse dada utilização ao bem expropriado. Tendo este Código entrado em vigor em 7-2-92, esse prazo completou-se em 7-2-94, sendo este o momento em que surgiu o direito de reversão da Recorrente, reconhecido por este Código.
Iniciando-se em 7-2-94 o prazo de exercício do direito de reversão, a reversão poderia ser requerida no prazo de dois anos a partir dessa data, isto é, até 7-2-96, nos termos do disposto no n.º 6 do citado art. 5.º.
Na verdade, à face desta norma, o termo inicial do prazo de caducidade do direito de reversão coincide com a ocorrência do facto que o originou, que, no caso, é o decurso do período de dois anos posterior à entrada em vigor do Código das Expropriações aprovado pelo Decreto-Lei n.º 438/91 (…)”
Retomando o caso dos autos e ao invés do que a recorrente I...alega na sua alegação e conclusão recursória, não ressalta dos documentos juntos aos autos e do processo instrutor apenso que a Contra-interessada C...tenha pedido a reversão daquelas parcelas de terreno doadas no âmbito da operação de loteamento titulado pelo alvará n.º 708/84, em momento anterior ao dia 02.10.1996, pelo que terminado o prazo para a requerer em 07.02.1996, se deve concluir, ao invés do sustentado no acórdão recorrido que ocorreu a caducidade do direito de reversão em relação aquelas três parcelas de terreno.
Em suma está objectivado nos autos que o direito à reversão caducou, o que acarreta a nulidade das deliberações nos termos pretendidos pelo recorrente MP, o que vale por dizer que procede o recurso por si interposto.
*
No que tange ao recurso interposto pela contra-interessada I...na parte em que o tribunal «a quo» determinou a nulidade do acto administrativo de 22.04.98 (deliberação da CM Cascais) mediante a qual foi determinada a alteração ao alvará de loteamento nº 708/84,apura-se nos autos (vd. Pontos 8º a 13º) que em 9 de Janeiro de 1998, e por proposta apresentada pelo Presidente da Câmara, a Câmara Municipal deliberou por unanimidade aprovar a proposta de "... reversão das parcelas de terreno respeitante aos lotes cuja constituição será autorizada na operação de loteamento, com a área e confrontações definidas; na planta n°7, constante do processo de loteamento".
Mediante a referida deliberação, foi aprovada a reversão a favor da Contra -interessada C...das parcelas de terreno que por via do alvará nº 708/84 haviam sido cedidas para o Município de Cascais.
Em 28 de Agosto de 1997 a C...requereu a alteração do alvará nº 708/84, com vista à divisão em mais lotes, para construção.
A alteração ao alvará de loteamento foi aprovada na reunião da Câmara Municipal de Cascais de 22 de Abril de 1998, prevendo a constituição dos pretendidos lotes de terreno.
O Deliberado resultou de proposta apresentada pelo Presidente da Câmara Municipal, nela se considerando os pareceres favoráveis emitidos pelos serviços municipais constantes do processo, e bem assim a autorização de 2/3 dos proprietários dos lotes que integravam o loteamento 708/84, autorização essa anexa à deliberação de 09-01-98.
Em reunião da Câmara Municipal de Cascais de 29 de Julho de 1998, e como aditamento à deliberação de 9 de Janeiro de 1998, foi de novo aprovada sob a forma de aditamento à proposta de reversão de três parcelas de terreno, com indicação precisa, das áreas e descrição predial das mesmas, sendo as áreas a reverter inferiores às que anteriormente haviam sido cedidas ao Município.
Face a este quadro, a questão aqui a decidir consiste em aferir se a alteração ao alvará é um acto consequente do acto de reversão.
O acto consequente vem sendo definido como o acto administrativo que é praticado em função do acto administrativo anterior, pressupondo, para a sua validade, que o acto de onde emerge seja válido. Na verdade, o acto consequente só pode ser compreendido em função do acto anterior, que lhe serve de causa, e a sua manutenção é incompatível com a revogação ou anulação deste último, com a ressalva do preceituado na 2ª parte da al. I) do n.º2 do artigo 133º do CPA.
A propósito do regime jurídico de actos consequentes de actos administrativos, destaca-se o Ac. do STA, de 25.02.2003, proc.n.º0327/03:
“ (...) A questão..., não tem sido pacífica, nem na doutrina, nem na jurisprudência.
No entanto, sempre foi, entre nós, dominante a orientação de que os actos consequentes são nulos, caindo automaticamente, sem necessidade de impugnação, por mero efeito da anulação do acto anterior, do qual dependiam. (cf. Prof. Marcello Caetano, Manual de Direito Administrativo, II, 10ªed., p.1218 e Prof. Freitas do Amaral, Direito Administrativo, IV, 241).
Orientação que veio a ter consagração legal, na alínea i) do nº2 do artº133º do CPA, embora em termos mitigados, ao estabelecer que tal nulidade só ocorrerá “desde que não haja contra-interessados com interesse legítimo na manutenção do acto consequente.” O que ressuscitou a discussão em torno do âmbito desta restrição imposta por lei e, designadamente, de quais os interesses prevalentes em jogo.
Uma interpretação literal do citado preceito legal, parece apontar no sentido de que os actos consequentes de actos administrativos anteriormente anulados ou revogados só são nulos se não forem constitutivos de direitos ou interesses na esfera jurídica dos contra -interessados no procedimento administrativo, onde tais actos foram proferidos.
Segundo, porém, alguma doutrina, a referida salvaguarda legal, deve ser objecto de interpretação restritiva, enquanto manifestação do princípio da confiança, e, portanto, só deve intervir quando exista uma confiança digna de protecção, por aplicação do princípio da boa fé, com vista ao equilíbrio dos interesses em presença neste domínio, que devem ser ponderados, em presença do caso concreto, das consequências que para o recorrente e para o próprio interesse público adviriam da manutenção do acto consequente, por forma a evitar situações - limite de manifesto desequilíbrio na tutela a ser assegurada aos interesses em presença, ou seja, só se justificaria relativamente a terceiros, não intervenientes no processo. (cf. por exemplo, o Prof. M. Aroso de Almeida, Anulação de Actos Administrativos e relações jurídicas emergentes, nº109).
O Pleno deste Tribunal no entanto já se pronunciou no sentido de que «para ser compatível com o princípio da proporcionalidade, nos casos em que o desaparecimento dos actos consequentes atinge direitos constituídos, a regra de que são nulos os actos consequentes de actos anulados deve atingir apenas os actos ou partes do acto que seja estritamente necessário atingir para reconstituir a situação hipotética que existiria se não tivesse sido praticado o acto anulado.» (cf. o acórdão do Pleno da 1ª Secção de 17-06-93, rec.24 447 e de 14-03-2001, rec. 38 674; porém, no sentido de uma interpretação restritiva, o Ac. STA de 14-03-2001, rec.38 674).
Seja como for, o certo é que a nulidade do acto consequente do acto anulado, há-de supor a consolidação deste último acto na ordem jurídica (....)”.
A luz desta doutrina, visto que a recorrente I...interveio no procedimento na sequência imediata da escritura de reversão já que, no mesmo dia (5.8.98) a Chesol, para quem os terrenos haviam revertido, vendeu à I...as parcelas que haviam sido cedidas no âmbito da operação de loteamento titulada pelo alvará nº 708/84 (vd. ponto 16 do probatório) não se justificava a referida salvaguarda por se tratar de um terceiro interveniente no processo.
A esta luz, a alteração do alvará de loteamento configura a prática de um acto administrativo consequente o qual, repete-se, é aquele que é praticado ou dotado de certo conteúdo em virtude da prática de acto anterior; isto é, estamos na presença de actos consequentes quando a Administração pratica um acto no qual se alicercem outros.
Uma vez que o acto consequente é todo aquele que foi praticado ou dotado de um certo conteúdo em virtude de um acto administrativo anterior, em vista da situação vertente, em face da declaração da nulidade das deliberações camarárias de 9.1.98 e de 29.7.98, operaria o regime segundo o qual um acto "subsequente de um acto anterior revogado", e como tal abrangido pela previsão do art. 133º, nº 2, al. i), do CPA.
Nesta alínea prevê-se que, anulado ou revogado determinado acto, fiquem sem efeito, sem necessidade de pronúncia anulatória ou revogatória expressa, ou pelo menos sem sujeição aos prazos legais de interposição de recurso, os actos que tenham sido praticados em consequência do primeiro, no pressuposto de que o mesmo era um acto válido.
É forçoso concluir que cabe aqui a figura do «acto consequente» que é aquele que é praticado, ou dotado de certo conteúdo, em virtude da prática de outro acto anterior, que lhe serve de causa, raiz ou fundamento (cf. Acs. deste S.T.A. de 10.11.98, proc.º nº 34.873, 8.6.99, proc.º nº 37.243, 14.3.01, proc.º nº 38.674, e 4.12.02, proc.º nº 654/02).
É que, resulta, à evidência, da matéria de facto, que existe um nexo de dependência, uma subordinação de causa e efeito entre o acto de aprovação da reversão a favor da C...e o acto de alteração do alvará.
Ora, havendo de considerar-se nulo o acto de alteração do alvará como acto consequente que havia sido praticado, na sequência do acto que foi declarado nulo, há que atentar no regime jurídico da nulidade definido nos nº s. 1 e 2 do artº 134º do CPA.
Assim:
-O acto de reversão não produz quaisquer efeitos de direito, não constituindo, modificando ou extinguindo situações jurídicas;
-aquele acto de reversão não é susceptível de ratificação, reforma ou conversão, ou seja, é insusceptível de se tornar em acto válido por qualquer forma de convalidação;
- a nulidade produz efeitos “ex tunc”, ou seja, tem efeitos declarativos e retroage à data da prática do acto; o acto é nulo desde a origem;
- a declaração de nulidade produz efeitos “erga omnes”, em relação a todo e qualquer um;
- a nulidade é invocável a todo o tempo, isto é, é imprescritível;
- poderá ser invocada por qualquer interessado, incluindo aquele que para ela tenha contribuído de qualquer maneira, para obter a sua destruição;
-a nulidade também pode ser declarada a todo o tempo por qualquer órgão administrativo ou por qualquer tribunal; com efeito, uma vez detectada a inexistência a Administração está vinculada a declará-la.
Resulta do que vem dito que «in casu» não é possível a produção de “efeitos putativos” não se verificando, por isso, qualquer espécie de sanabilidade de alguns efeitos, pelo decurso do tempo.
Ora, a insusceptibilidade de produção de efeitos jurídicos acarreta a inexecutoriedade do acto nulo o qual é também insusceptível de ratificação, reforma, conversão ou revogação (artº 137º, nº 1 e 139º nº 1, al. a) do CPA).
Assim sendo e em face do que fica exposto, improcedem «in totum» as conclusões do recurso da contra -interessada I...– Gestão e Comércio de Produtos, Ldª.
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3. - DECISÃO
Nesta conformidade, acordam, em conferência, os Juízes do 2º Juízo do Tribunal Central Administrativo Sul, em:
a) -conceder provimento ao recurso do Ministério Público, revogando o acórdão recorrido e declarando nulas as deliberações de 29.1.98, 29.7.98 e de 22.4.98 e os contratos outorgados em 5.8.98.
b) -Negar provimento ao recurso interposto pela contra –interessada I...– Gestão e Comércio de Produtos, Ldª.
c) -Custas pela contra-interessada I...– Gestão e Comércio de Produtos, Ldª em ambas as instâncias e pela entidade pública demandada e pela C...apenas em 1ª instância, com 10 UCs de taxa de justiça.
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Lisboa, 25.11.2009

(Gomes Correia)
(A. Vasconcelos)
(Carlos Araújo)

5 comments:

Anonymous said...

por isto é que este site tem sempre os mesmos...preocupados...
para imprimir isto só num rolo de papel higiénico

Anonymous said...

Este tipo deve pensar que alguém lê isto...

Anonymous said...

O anónimo anterior deve ser o Homer Simpson.

M P P said...

Ninguém faz o resumo deste relambório?

JDinis said...

Venho só aqui dar os meus parabéns a quem leu isto tudo.