Friday, November 06, 2009

STA - sentença final sobre um prédio já feito

Acordam em subsecção, na secção do contencioso administrativo do Supremo Tribunal Administrativo:


Data do Acordão:14-10-2009
Tribunal:2 SUBSECÇÃO DO CA
Relator:ALBERTO AUGUSTO OLIVEIRA
Descritores:PLANO DIRECTOR MUNICIPAL
UTILIZAÇÃO
Sumário:O índice de utilização a que se o artigo 27.º, n.º 1, alínea a), parte final, do RPDM de Cascais, ratificado pela Resolução do Conselho de Ministros n.º 96/97, de 19 de Julho, afere-se pelo quarteirão no seu todo, ainda que nele se integrem espaços urbanos de diferente densidade.
Nº Convencional:JSTA000P10953
Nº do Documento:SA1200910140663
Recorrente:PRES DA CM DE CASCAIS - A...
Recorrido 1:B... E OUTROS
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:


1.
1.1. B… e outros, identificados nos autos, intentaram acção popular contra o Presidente da Câmara Municipal de Cascais e A….Lda., pedindo a declaração de nulidade da licença de construção titulada pelo alvará de licença de construção nº 1554, de 14/12/2001, respeitante a prédio no Estoril.
1.2. Pelo Ministério Público foi suscitada a irrecorribilidade do acto impugnado. Essa questão foi decidida pelo despacho de fls. 344-346, transitado em julgado, pelo qual se decidiu:
“[…] os recorrentes identificam de forma clara e entendemos que correcta, o acto que pretendem impugnar e que, entendemos também, é contenciosamente impugnável.
Trata-se não do alvará de construção – que é um mero documento que serve de título ao acto de licenciamento – e sim da licença de construção, ou licenciamento da construção.
No caso dos autos, não existiu propriamente uma deliberação da Câmara Municipal ou um despacho da entidade com delegação de competências para o efeito, no sentido expresso do licenciamento da construção. Houve duas aprovações de projectos, da arquitectura e das especialidades, a que se seguiu a emissão do título do licenciamento.
É do licenciamento – que decorre da aprovação daqueles projectos – que os recorrentes vêm recorrer contenciosamente.
O que se admite.”
1.3. Por sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra, de fls. 402 e segts., foi julgada procedente a acção e declarada a nulidade do acto administrativo datado de 25.2.2000, praticado pelo Presidente da Câmara Municipal de Cascais.
1.4. Discordando, o Presidente da Câmara Municipal de Cascais deduziu o presente recurso, concluindo nas respectivas alegações:
“I - A douta sentença recorrida faz uma errada interpretação das normas constantes das alíneas a) e b) do art. 27° do Regulamento do Plano Director Municipal de Cascais;
II - A interpretação das normas do RPDM, em especial do art. 27°, não pode alhear-se dos princípios materiais que informaram o PDM, designadamente, a classificação das categorias de espaços e o espírito que presidiu a essa classificação;
III - Quando da elaboração do PDM, constatou-se que no topo Norte do Casino, bordejando a Praça Almeida Garrett, existia já uma bancada de edifícios de média densidade;
IV - Para se ir de encontro à realidade existente, o PDM classifica essa zona como espaço urbano de média densidade, a qual se estende ao terreno onde se encontra implantado o edifício licenciado;
V - O quarteirão passou, com a entrada em vigor do PDM, a ser dividido em termos de planeamento em duas zonas distintas;
VI - Essa distinção, reflectir-se-á necessariamente na interpretação do art. 27° do Regulamento, que deste modo quando fala de quarteirão ou de cérceas, se reporta apenas a parte do quarteirão integrante da categoria no espaço territorial respectivo;
VII - Pelo que situando-se o edifício em espaço urbano de média densidade, o acto de licenciamento é perfeitamente válido, porque cumpre todos os parâmetros e condicionamentos constantes do Regulamento do Plano Director Municipal”.
1.5. A…, Lda. também recorreu, concluindo:
“I - MODIFICAÇÃO DA DECISÃO DE FACTO
A) O Tribunal não deu como provados os seguintes segmentos de facto, que são relevantes para o efeito desta acção e - estando, de resto, em parte implícitos na sentença - decorrem de documentos não impugnados:
• que o quarteirão em que está integrado o prédio dos autos, situado a tardoz deste, se situa - com excepção da construção em apreço - numa zona classificada como de baixa densidade, porque é isso que resulta dos documentos referenciados nos factos assentes da sentença recorrida e ainda da planta do Departamento de Urbanismo e Infraestruturas da Câmara Municipal de Cascais junta como Doc. 3 à p.i ..
• que o imóvel em apreço evidencia uma cércea claramente inferior ao prédio situado no outro lado do arruamento e uma cota claramente inferior ao prédio situado a norte (para além de que a sua fachada não ultrapassa os 16 metros), como decorre das fotografias não impugnadas juntas como Docs. 9 e 10 à audição prévia que consta do processo instrutor.
B) Tais factos foram expressamente invocados na contestação da Recorrente, devendo ser considerados assentes, nos termos do art. 712° n° 1 do C.P.C.; ou, caso assim se não entendesse, o Tribunal não deveria ter passado à fase de alegações sem esclarecimento desta matéria de facto, pelo que, nessa hipótese, o processo deve baixar à 1ª instância para a produção da prova arrolada na contestação da ora Recorrida, nos termos do art. 712° n° 4 do C.P.C ..
II - A PRETENSA VIOLAÇÃO DO ART. 27°-a) do RPDM DE CASCAIS
C) A sentença assenta num pressuposto errado: o de que o índice admissível seria, no limite, de 0,44; mas não tem razão, porque, no caso da construção dos autos, o índice de utilização aplicado - 1,00 - respeita o PDM.
D) O prédio em apreço integra uma zona de média densidade, quando a restante parte (quase totalidade) do quarteirão se integra numa zona de baixa densidade.
E) E a sentença parte do princípio de que a obra deveria respeitar o índice de utilização existente no quarteirão, como resultaria da parte final da alínea a) do art. 27° do RPDM.
F) Mas não tem razão, porque o índice de utilização existente no quarteirão só teria de ser considerado se todo o quarteirão integrasse a mesma categoria de espaço urbano, o que aqui não acontece, pois no quarteirão em apreço o PDM quis estabelecer uma distinção entre uma zona de média densidade e outra de baixa densidade - cfr. as plantas de ordenamento, que constam do Doc. 3 junto à p.i. - que evidenciam à saciedade que são bem distintas as manchas de média densidade e de baixa densidade que a carta de ordenamento prevê para o local em apreço.
G) Não faz qualquer espécie de sentido aplicar à zona de média densidade o índice da zona de baixa densidade, sob pena de se tornar inútil a diversa classificação atribuída pelo PDM aos espaços urbanos em causa.
H) É que se os espaços de média densidade tivessem de ponderar médias com espaços de baixa densidade inseridos no mesmo quarteirão, a consequência poderia ser - como seria no caso presente, em que temos uma pequena mancha de média densidade num vasto quarteirão de baixa densidade - a de anular completamente o efeito da classificação de média densidade, submetendo essa área a critérios que só se justificam para a baixa densidade.
I) Estamos, pois, perante um prédio integrado numa zona de média densidade sem características bem definidas, o que deve levar à aplicação dos parâmetros aplicáveis aos loteamentos, por força da aplicação analógica do art. 25° n° 1- a). 1 do RPDM.
J) Ora, nos termos do art. 29° do RPDM, que se aplica aos loteamentos dos espaços de média densidade, o índice de utilização pode ir até 1,00, com uma altura máxima de 16 metros para a fachada e demais características definidas nesse preceito legal, o que a obra - já executada - respeitou integralmente, sem prejuízo, obviamente, de também terem sido respeitadas as características morfológicas dominantes, tal como resulta dos princípios do PDM que previu uma mancha de média densidade no coroamento a Praça Almeida Garrett, a norte do Casino do Estoril, com a evidente intenção de estabelecer uma consolidação da frente edificada neste espaço, fazendo uma transição de cérceas para as áreas de baixa densidade situadas a tardoz.
K) A sentença recorrida faz, pois, uma errada interpretação do PDM, já que não há qualquer violação do PDM nem de qualquer norma de direito administrativo, uma vez que não é o art. 27º - a) do RPDM que se aplica ao caso dos autos, mas os princípios consignados nos arts. 25° nº 1-a). e 29° nº 2 do RPDM, devidamente conjugados, já que o prédio dos autos se situa numa zona de média densidade sem uma envolvente com características bem definidas, tendo a tardoz um quarteirão integrado num espaço de baixa densidade.
III - A PRETENSA VIOLAÇÃO DO ART. 27°-b) DO RPDM
L) A sentença considera ainda que a nulidade do acto recorrido decorre da violação da alínea b) do art. 27° do RPDM, porque a altura da fachada excederia os 16 metros, como resultaria da alínea J) dos factos assentes.
M) Na verdade, tal limite deve ser respeitado, não por força da alínea b) do art. 27° do RPDM, mas em resultado da aplicação do art. 29° nº 2-c) do RPDM.
N) Porém, a sentença recorrida assenta em vários equívocos, a saber:
• a alínea J) dos factos assentes reproduz o alvará de licenciamento da construção, mas não mede a altura da fachada na construção que efectivamente foi efectuada no local;
• mais grave: confunde cércea com altura da fachada, que são conceitos distintos (cfr. art. 2° do RPDM de Cascais);
• finalmente: a altura da fachada não ultrapassa efectivamente os 16 metros, como se sustenta na contestação.
O) Em suma, neste segmento, a sentença recorrida assenta num pressuposto de facto que não consta dos factos assentes.
É que não está assente - designadamente na alínea J) dos factos assentes - que a edificação efectivamente existente no local dos autos tem uma altura de fachada superior a 16 metros.
IV - DA PROTECÇÃO DA CONFIANÇA
P) A ora Recorrente está de boa fé, tendo adquirido o prédio dos autos com o projecto já aprovado, confiando em actos administrativos emanados da autarquia pelo órgão competente, estando a obra executada e tendo já sido alienadas parte das fracções e prometidas vender outras.
Q) Os princípios da protecção da confiança e da segurança nas relações jurídicas não deviam ter deixado de ser também considerados pelo Tribunal em termos que impediriam a procedência da acção, em face das consequências manifestamente desproporcionadas que isso acarretaria em função dos interesses urbanísticos, económicos e sociais que estão em jogo, o que a sentença não fez”.
1.6. Os autores populares alegaram, suscitando a deserção dos recursos jurisdicionais, por extemporaneidade. Essa questão foi decidida por despacho de fls. 521, não impugnado.
Na parte restante, concluíram:
“I - A douta sentença recorrida não enferma qualquer vício, fazendo uma correcta interpretação das normas constantes das al. a) e b) do Art. 27º do Regulamento do Plano Director Municipal de Cascais;
II - O índice de construção licenciado ultrapassa o índice de utilização existente no quarteirão em mais do dobro - 0,44 no limite superior, contra 1,00 efectivamente licenciado - facto que viola de forma clara e inequívoca o disposto na al. a) do Art.º 27º do Regulamento do Plano Director Municipal de Cascais;
III - A cércea licenciada para o prédio em questão é de 18,00 metros, o que viola o disposto na al. a e na al. b) do Art.º 27º do Regulamento do Plano Director Municipal de Cascais;
IV - Mesmo atendendo aos sacrossantos princípios da confiança e da segurança nas relações jurídicas, o licenciamento que a douta sentença recorrida anula não pode sobrepor-se aos interesses dos cidadãos, legitimamente protegidos e constitucionalmente consagrados, por quaisquer motivos particulares de natureza económica, como invoca a Contra-interessada A…, Lda.
V- Atender aos fundamentos invocados pelos Recorrentes equivale a dar guarida a toda a espécie de atropelos aos normativos legais ordenadores do território, em benefício de uma política economicista baseada no betão e nos gordos lucros que a mesma proporciona.
VI - A licença de construção do prédio titulada pelo Alvará n.º 1554, de 14/12/2001 é nula por vício de violação de lei resultante da inobservância da parte final da al. a) do Art.º 27º do RPDM de Cascais, por claro desrespeito do índice de utilização existente no quarteirão.
VII - É ainda nula por vício de violação de lei resultante da inobservância da primeira parte a al. a) e da al. b) do Artigo 27° do Regulamento do PDM de Cascais, por desrespeito da moda das cérceas da frente edificada onde se integra o edifício e do limite à regra do nivelamento pela moda das cérceas”.
1.7. A EMMP emite parecer no sentido do não provimento do recurso; louva-se na posição assumida pelo Ministério Público no Tribunal Central Administrativo, para onde o recurso foi inicialmente dirigido.
2.
2.1. A sentença fundou-se na seguinte matéria de facto:
“Consideram-se provados os seguintes factos, mediante prova documental, junta aos autos e constantes do processo instrutor e por acordo, resultante da articulação das partes, relevantes para a decisão da causa:
A) Em 21/09/1999 foi apresentado na Câmara Municipal de Cascais o requerimento n° U-13775/99, pelo qual foi requerida a aprovação do licenciamento de construção do prédio novo, a edificar na Av. …, nº …, Estoril, descrito na Conservatória do Registo Predial de Cascais, freguesia do Estoril, sob os artigos 1060 a 6244 - Acordo e cfr. proc. adm. apenso;
B) Em 13/12/1999, o Chefe de Divisão da DUI-DGUO, da Câmara Municipal de Cascais emitiu a seguinte informação: "O presente projecto diz respeito à construção de um edifício condominial, no Estoril, e em local abrangido pela classe de espaço urbano de média densidade. Da análise do projecto verifica-se: 1 - Ser o índice de construção proposto excessivo para o máximo definido no regulamento PDM/Cascais para a classe de espaço - proposto 1,10=i; (...)" - doc. de fls. 71 dos autos;
C) Em 24/02/2000 o Chefe de Divisão da DUI - DGUO, da Câmara Municipal, emitiu parecer no sentido de "a área de construção contabilizável do projecto não deverá ultrapassar o índice 1,00 aplicável ao local (. . .) e não o índice 1,03, por aproximação, que tem por excesso nas áreas de construção contabilizável de 92.00 m2 " - cfr. fls. 73 dos autos;
D) Em 25/02/2000, mediante despacho do Presidente da Câmara de Cascais foi aprovado o projecto de arquitectura - Acordo e docs. de fls. 29 dos autos;
E) O que foi comunicado nos termos do ofício enviado à "C…, Lda. e Outros", sob nº 016544, datado de 15/03/2000, com o seguinte teor: "(...) comunico que o mesmo foi deferido por despacho de 25/02/2000 exarado pelo Senhor Presidente da Câmara (. ..)
Fica ainda condicionado a: (...)
- Sendo a área do terreno de 2.904,00 m2, deverá o técnico autor do projecto juntar peças desenhadas rectificadas, em que a área de construção contabilizável do projecto não deverá ultrapassar o índice 1,00 aplicável ao local (UMD.) e não o índice 1,03, por aproximação, que têm por excesso uma área de construção contabilizável de 92,00 m2. (...)" - cfr. proc. adm. não paginado;
F) Em 17/01/2000 deu entrada um "Aditamento à Memória Descritiva", pronunciando-se a interessada sobre a área de construção no sentido de "(...)
Assim, a superfície de pavimento passará a ser de 2.996 m2, o que dá um índice 1,03, portanto por aproximação igual a 1,00. 2. Relativamente à relação com o prédio vizinho a norte apresentam-se elementos gráficos elucidativos onde se pode verificar o cumprimento do RGEU e da altura de fachada relativa à classe de espaços urbanos de média densidade." - doc. constante do proc. adm.;
G) Em 13/04/2000 deu entrada um "2º Aditamento à Memória Descritiva", do mesmo constando, "( ... ) Como resultado, a área final de construção passará a ser 2.902,2 m2, conforme quadro de áreas em anexo." - cfr. proc. adm.;
H) Em 08/08/2001 a ora Recorrida Particular requereu o averbamento do processo administrativo de licenciamento, para seu nome, invocando a qualidade de proprietária, o que foi deferido por despacho de 21/08/2000 - Acordo e proc. adm.;
I) Em 02/10/2001 foram aprovados os projectos das especialidades - Acordo e cfr. proc. adm.;
J) Em 14/12/2001 foi emitido o alvará nº 1554, em nome da Recorrida Particular, de licenciamento da construção que incide sobre o prédio sito na Av. …, n° …, Estoril, descrito na Conservatória do Registo Predial de Cascais sob o n° 02408/02409, nele constando o que se extrai, por súmula: "( ...) A construção, cujo projecto de arquitectura foi aprovado por despacho de 25/02/2000 os projectos de especialidades aprovados por despacho de 02/10/2001 respeita o disposto no Plano Director Municipal apresenta as seguintes características: UOPG: 15.
Área de construção 2.855,90 m2 acima da cota de soleira mais 2.216,80 m2 abaixo da cota de soleira. Área de construção total 5.072,70 m2, estando incluída nesta área 2.855,2Q m2 não contabilizados para efeitos de índice de construção de acordo com o PDM. N° de pisos Quatro acima e Dois abaixo da cota de soleira; Cércea 18,00 m; N° de fogos Dezassete + 1 Loja;
Uso a que se destinam: Habitação/Comércio.
Condicionantes do licenciamento do processo de construção n° 13775/1999.
(...)" - cfr. proc. adm. e doc. de fls. 29 dos autos;
K) Em 28/06/2002, o Director do Departamento de Urbanismo e Infraestruturas, da Câmara Municipal de Cascais, emitiu o seguinte parecer: "1. Subscrevemos inteiramente as preocupações manifestadas em relação à construção levada a cabo na Av. … referente ao processo de licenciamento n° 13775/99 (CX 30134), cujo projecto de arquitectura foi aprovado por despacho exarado pelo Sr. Presidente da Câmara em 25.02.00. Aproveitamos igualmente para manifestar a nossa clara e inequívoca discordância, à proposta de ocupação em análise, que do nosso ponto de vista, subverte inevitavelmente os condicionamentos expressos no PDM, que inscreve maioritariamente o terreno na "Categoria de Espaço Urbano de Média Densidade". Neste sentido, cabe a este Departamento no essencial sintetizar o seguinte:
a) As obras de construção na "Categoria de Espaço Urbano de Média Densidade" estão sujeitas aos condicionamentos enunciados no Artº 27º (Sub-Secção II) do R.PDM, remetendo (entre outros aspectos) a ocupação do solo, para determinação prévia do índice de utilização existente no quarteirão. Neste contexto, considera-se elevada e desajustada da realidade do sítio, a área de construção proposta e consequentemente o índice de construção resultante (i=1.00), comprometendo o disposto na alínea a), do Artº 27 do RPDM. Este entendimento é reforçado pelo facto das características morfológicas dominantes do quarteirão assentarem no zonamento HC do PUCS (plano eficaz antes de vigorar o PDM) que aponta para um índice máximo de construção igual a 0,35.
b) Questionamos igualmente a integração do edifício proposto, nomeadamente, o enquadramento e a sua relação volumétrica com o troço do lado do arruamento onde se integra o novo edifício (Avª …) ao propor quatro pisos numa frente edificada com um valor de observação não superior a 2 pisos, contrariando claramente o preconizado na alínea a) do Artº 27º do mesmo Diploma. Acresce ainda o facto da solução não articular formal e volumetricamente com o terreno confinante a Nascente (Feira de Artesanato) originando um impacto visual negativo, contrariando cumulativamente o disposto nos Artºs. 121º e 122º do RGEU
2. Face ao exposto e à perspectiva da invalidade do licenciamento nos termos da alínea b) do nº 2, do artº 52º do Dec-Lei 250/95, propõe-se que o assunto tenha um enquadramento jurídico adequado à situação, solicitando-se proposta de procedimento tendo em atenção o adiantado estado de execução da obra." - cfr. proc. adm. e doc. de fls. 111-112 dos autos;
L) Em sequência, em 01/07/2002 o Presidente da Câmara Municipal emitiu o seguinte despacho: "Concordo. Proceda-se em conformidade com fundamento em parecer jurídico inequívoco, o qual deverá ser submetido a despacho do Vereador e do signatário, e merecedor de comunicação pública." - doc. de fls. 111 dos autos;
M) Em 17/07/2002 o Director do DJA da Câmara Municipal de Cascais emitiu a informação sobre "Assunto: Processo de construção n° 13775/99 Av. …, n° …, Estoril", onde conclui do seguinte modo, o que se extrai, em súmula: "(...) 7ª - Nas informações técnicas é referido que o prédio se integra na Categoria de Espaço Urbano de Média Densidade, quando abrange esta categoria e a Classe de Espaço de Equipamento, com índices e especificações diferenciados e sem que a apreciação do reqº. n° U- 13775/99 tenha reflectido essas diferentes qualidades. 8ª - Na Categoria de Espaço Urbano de Média Densidade, por força do disposto na alínea a) do artigo 27º do RPDM, o índice a observar é o que resultar do índice de utilização existente no quarteirão. 9ª - Sabendo que a alínea a) do artigo 27º do RPDM manda considerar o índice de utilização existente no quarteirão, e que este foi erigido de acordo com as prescrições do P.U.C.S., mais concretamente em zonamento HC em que o índice de ocupação máximo permitido era 0,35, resulta de todo indecifrável o porquê de se ter fixado no processo U-13775/99 o índice em 1.00 e ser gigantesca a desproporção entre estes dois índices. 10ª - Desconhece-se como tal índice foi fixado, em obediência a que critérios, nem sequer se ele resultou do estudo das edificações construídas no quarteirão e da relação a que se refere a alínea d) do n° 3 do artigo 2º do RPDM. 11ª - Não estando minimamente fundamentado de facto e de direito a fixação de tal índice, mas tendo sido feita apenas uma vaga referência a um índice de 1.00 permitido para o local, sem que se consiga descortinar porquê, a inobservância do disposto naquela norma acarreta, os termos da alínea b) do n° 2 do artigo 52º do Decreto-Lei n° 445/91, na redacção que lhe foi dada pelo Decreto-Lei n° 250/94, de 15 de Outubro, a nulidade do acto administrativo de 25 de Fevereiro de 2000 que aprovou o reqº n° U-13775/99, vício esse que se transmite aos actos subsequentes. (...) 14º - Pelo exposto propõe-se que:
a) seja declarada a nulidade do acto administrativo de 25 de Fevereiro de 2000, do Sr. Presidente da Câmara, com base no qual foi aprovado o reqº n° U-13775/99, de 21 de Setembro, por violação do disposto na parte final da alínea a) do artigo 27° do RPDM e com fundamento na alínea b) do n° 2 do artigo 52° do Decreto-Lei n° 445/91, de 20 de Novembro, na redacção que lhe foi dada pelo Decreto-Lei n° 250/94, de 15 de Outubro, e no n° 2 do artigo 134° do C.P.A.
b) Seja ordenada a cassação do alvará de licença de construção n° 1554, de 14 de Dezembro de 2001, emitido em nome de A…, Lda., notificando-se a interessada a devolvê-lo à Câmara Municipal no prazo máximo de 48,00 horas, (...).
c) Ser ordenado o embargo das obras em curso, por força do disposto no artigo 57º do Decreto-Lei n° 445/91 (...).
15° - Nos termos dos artigos 100° e seguintes do C.P.A., propõe-se a realização da audiência de interessados ( ... )" - cfr. fls. 86 a 109 dos autos;
N) Sobre a Informação que antecede, o Presidente da Câmara Municipal de Cascais, em 18/07/2002, proferiu o seguinte despacho "Concordo com a proposta do Sr. Director do DJA contida nos pontos 14º 15º e 16° da presente informação" - cfr. proc. adm.;
O) Por despacho de 24/07/2002, do Director do DJA, foi ordenada remessa do processo à Chefe do DADU para prossecução do processo - cfr. proc. adm.;
P) Em 26/07/2002 foi elaborado pelo fiscal municipal da Câmara Municipal de Cascais, auto de embargo da obra edificada - cfr. proc. adm.;
Q) Na mesma data, em 26/07/2002, sob o ofício n° 31784, a ora Recorrida Particular foi notificada da proposta de decisão de declaração de nulidade do acto administrativo de 25/02/2000 do Sr. Presidente da Câmara, da cassação do alvará de construção nº 1554, de 14/12/2001 e do embargo das obras - cfr. doc. constante do proc. adm. apenso, para que se remete;
R) Sobre o auto de embargo, em 09/08/2002, o Presidente proferiu o seguinte despacho "Ao DPM para revogar o presente auto até ao decurso da audiência prévia, conforme ofício 31784 de 20.7.02" - cfr. proc. adm. e doc. de fls. 116 dos autos;
S) Em 19/08/2002, a Recorrida pronunciou-se em audiência prévia, para o que invocou a falta de fundamento da proposta de decisão e a protecção jurídica da confiança, requerendo ao Presidente da Câmara Municipal que não sancione a proposta de decisão - cfr. doc. constante do proc. adm. não paginado, a fls. 121-127 dos autos, para que se remete, para todos os efeitos;
T) Na sequência da proposta de alterações apresentada pela Recorrida Particular, em 09/10/2002, o Director do DJA pronunciou-se no sentido de "(...) 2. As alegações produzidas, com todo o respeito que me merecem, não são susceptíveis de fazer alterar o teor do meu parecer, continuando por isso a defender a nulidade do licenciamento. (...)" - doc. constante do proc. adm. não paginado;
U) Em 14/10/2002 o Presidente da Câmara proferiu o seguinte despacho: (...) Não posso deixar de ter em conta, por outro lado, que, não tendo dúvidas quanto à boa fundamentação jurídica que conduziria à anulação do licenciamento, há que ter em conta o elevadíssimo montante envolvido no caso de a Câmara ser condenada a indemnizar os promotores. (...)" - doc. constante do proc. adm.;
V) Em 22/10/2002 o Director do DJA, em "Informação ao Sr. Presidente da Câmara" fez constar: "( ... ) Sendo óbvia a fragilidade do Município de Cascais ao ter licenciado a construção em causa, sujeitando-se ao pagamento de uma vultuosa indemnização em caso de declaração de nulidade do acto e consequente demolição da parte construída em excesso, creio que se justificará uma ponderação jurídica (para além da urbanística) da proposta que vier a ser apresentada." - doc. de fls. 132 dos autos;
W) Em sequência, em 28/10/2002, o Presidente da Câmara Municipal proferiu o seguinte despacho: "Ao Vereador D… para verificar a conformidade da obra realizada com o projecto e apurar a conformidade construtiva do local face ao PDM, tudo com a maior urgência." - doc. de fls. 132 dos autos;
X) Em 08/11/2002 foi prestada a seguinte informação: "De acordo com o levantamento de informação de quarteirão elaborado pelo Sr. Topógrafo E…, datado de Março de 2002, o índice médio do quarteirão, onde se insere a construção assinalada é de 0,39. Neste índice foi contabilizada a área da referida construção (recentemente embargada), a área do lote vago e a Feira de Artesanato (conforme Documento n° 1 em anexo). Se com estes valores do índice do quadro, calcularmos o índice medido do quarteirão, sem contabilizarmos as áreas ocupadas pela Escola Básica do 1º ciclo do Estoril, sem a Esquadra da P.S.P. do Estoril e sem a área do terreno vago, o índice medido do quarteirão será de 0,355, ou seja, 0,36. No entanto, se consideramos o índice de utilização líquido, para o referido quarteirão (...) incluindo a Escola Básica do 1º ciclo do Estoril (...) e a Esquadra da P.S.P. do Estoril; excluindo a área de construção embargada (...) a área do terreno vago (...) e a Feira do Artesanato da Costa do Estoril (...), o índice médio para o respectivo quarteirão é de 0,440. Mas se, neste último cálculo, incluirmos a área da Feira do Artesanato da Costa do Estoril, o índice médio é de 0,38 (...)" - doc. de fls. 133-134 dos autos e proc. adm;
Y) Em 18/11/2002 o Coordenador do GEUR, em substituição, informou o seguinte: "Do estudo de quarteirão supra, foram analisados os parâmetros urbanísticos relevantes tendo em conta as seguintes premissas: (...) Deste modo, a área de terreno contabilizável é de 20.860 m2 e a área construída é de 9.090 m2 o que perfaz um índice médio de 0,435" - doc. de fls. 137 dos autos;
Z) A presente acção popular foi proposta em juízo em 28/02/2003 - doc. fls. 1 dos autos;
AA) Em sequência à pronúncia escrita apresentada pela ora recorrida particular em fase de audiência prévia, assente em S), foi emitido parecer jurídico pelo Dr. F…, conforme documento constante no proc. adm., sob designação de "E-09002/03", de 24/04/2003, do mesmo se extraindo o seguinte: "( ... ) 9 - Em minha opinião a interpretação das normas do RPDM, em especial o artº 23º não pode alhear-se dos princípios materiais que informam o PDM, designadamente, a classificação das categorias de espaços, e o espírito que presidiu a essa classificação, bem dos objectivos que se procuraram atingir com essa classificação. (...)" - cfr. proc. adm., para que se remete e se considera integralmente reproduzido;
BB) Sobre a pronúncia apresentada pela ora Recorrida Particular que se dá como assente em S), o Presidente da Câmara Municipal de Cascais em 28/05/2003, emitiu o seguinte despacho: "Deferido com os fundamentos constantes dos nºs. 9 a 16 do Parecer do Dr. F… com o n° de registo E-9002/03. Comunique-se ao DPM para os fins convenientes." - cfr. doc. constante do proc. adm;
CC) A construção aprovada situa-se em local abrangido pela "categoria de espaço urbano de média densidade" (2441.05 m2) e de "classe de espaço de equipamento" (687.55 m2), sendo aquela a dominante, nos termos do Plano Director Municipal do Município de Cascais - Acordo e cfr. proc. adm.;
DD) A obra encontra-se totalmente executada - cfr. proc. adm;
EE) A Recorrida Particular alienou algumas fracções edificadas no prédio a que se refere em A), tendo prometido vender outras fracções - cfr. proc. adm. e doc. de fls. 130 dos autos.
*
Não resultou provado qualquer outro facto com relevo para a decisão da causa.”
2.2. No recurso, os autores populares sustentaram que o licenciamento da obra violava o artigo 27.º, alíneas a) e b), do Regulamento do Plano Director Municipal de Cascais ratificado pela Resolução do Conselho de Ministros n.º 96/97, de 19 de Julho, por ter sido permitida construção com índice muito superior ao índice do quarteirão em que se insere e também por ultrapassagem do valor permitido da cércea.
A sentença considerou verificadas as duas violações.
Resulta das conclusões das alegações de recurso que está primacialmente em causa a interpretação e consequente aplicação pela sentença daqueles dispositivos.
Nas alegações da recorrente A… suscita-se, ainda, um problema de fixação de matéria de facto. A questão só terá relevo se interessar à decisão final. Assim, será contemplada no quadro da apreciação que se vai fazer de seguida.
2.2.1. Interessa recordar o mencionado artigo 27.º, inserido no “Capítulo III -- Da ocupação, uso e transformação do solo”, “Secção II – Regime de administração urbanística dos espaços”, “Subsecção II -- Categoria de espaços urbanos de média densidade”.
“Artigo 27.º
Obras de construção
As obras de construção ficam sujeitas aos seguintes condicionamentos, sem prejuízo do disposto nos nºs. 2 e 2.1 do artigo 94°:
a) É autorizado o nivelamento da cércea pela moda das cérceas (valor de observação mais frequente) da frente edificada do lado do arruamento onde se integra o novo edifício, no troço de rua entre duas transversais ou no troço de uma rua que apresenta características morfológicas homogéneas, desde que não ultrapasse o que decorre da aplicação do artigo 59° do Regulamento Geral das Edificações Urbanas, e ainda considerado o índice de utilização existente no quarteirão;
b) No caso previsto na alínea anterior, a altura máxima de fachada do novo edifício não pode em qualquer caso exceder os 16 m.
[…]”.
Julgou a sentença, quanto à violação do índice de utilização:
“Ora, de acordo com os parâmetros apurados no quarteirão pela Entidade Pública Recorrida, de entre as várias possibilidades que admite, do que resulta é que em todas elas o índice licenciado é muito superior ao máximo legalmente permitido, sendo no seu máximo apurado de 0,44 (se for calculado o índice de utilização líquido, incluindo a Escola Básica do 1 ° ciclo do Estoril, a esquadra da PSP e excluindo a área de construção embargada, a área do terreno vago e a Feira do Artesanato), quando o índice do prédio dos autos apresenta um índice de utilização de 1,00 (cf. alíneas X) e Y) dos Factos Assentes).
Assim, concordando com os pareceres técnicos emitidos pelos serviços da Entidade Recorrida, que se levaram ao probatório nas alíneas K), M) e T), as obras de construção na categoria de espaço urbano de média densidade estão sujeitas aos condicionalismos enunciados no art° 27° do RPDM, para o que a ocupação do solo quanto à determinação prévia do índice de utilização, remete para o índice médio existente no quarteirão, sendo, em consequência, elevado e desajustado para o local o índice de 1,00, violador da citada alínea a) do art° 27° do RPDM de Cascais, por independentemente da forma de cálculo ser esse índice muito superior ao do respectivo quarteirão”.
2.2.2. A discordância do Presidente da Câmara centra-se em que:
“V - O quarteirão passou, com a entrada em vigor do PDM, a ser dividido em termos de planeamento em duas zonas distintas;
VI - Essa distinção, reflectir-se-á necessariamente na interpretação do art. 27° do Regulamento, que deste modo quando fala de quarteirão ou de cérceas, se reporta apenas a parte do quarteirão integrante da categoria no espaço territorial respectivo;
VII - Pelo que situando-se o edifício em espaço urbano de média densidade, o acto de licenciamento é perfeitamente válido, porque cumpre todos os parâmetros e condicionamentos constantes do Regulamento do Plano Director Municipal”.
Essa mesma tese é sustentada pela recorrente particular:
“F) [...], porque o índice de utilização existente no quarteirão só teria de ser considerado se todo o quarteirão integrasse a mesma categoria de espaço urbano, o que aqui não acontece, pois no quarteirão em apreço o PDM quis estabelecer uma distinção entre uma zona de média densidade e outra de baixa densidade - cfr. as plantas de ordenamento, que constam do Doc. 3 junto à p.i. - que evidenciam à saciedade que são bem distintas as manchas de média densidade e de baixa densidade que a carta de ordenamento prevê para o local em apreço”.
A tese dos recorrentes assenta, assim, em que, apesar de a construção em crise se integrar em espaço urbano de média densidade, o quarteirão em que se insere integra duas categorias - integra a categoria de espaço urbano de baixa densidade e integra a categoria de espaço urbano de média densidade. Por isso, também haverá uma dicotomia a fazer na interpretação da norma. Não é de considerar o índice de utilização global existente no quarteirão.
Diversamente, sustentam os recorridos a indivisibilidade do “quarteirão” para efeitos do artigo 27.º, a).
2.2.3. As duas teses foram expressamente consideradas pela sentença, pois que já então haviam sido esgrimidas.
Não vêm questionados os diplomas jurídicos considerados aplicáveis pela sentença e também não se revela qualquer erro nessa parte.
Vejamos.
Nos termos da sentença, deve entender-se por quarteirão o conjunto de edifícios implantados numa área urbana delimitada por arruamentos.
Arruamento deve ser entendido como qualquer via de circulação no espaço urbano, podendo ser qualificada como automóvel, pedonal ou mista, conforme o tipo de utilização.
Por sua vez, por arruamento automóvel deve entender-se o alinhamento ou disposição das ruas para circulação de veículos, e por arruamento pedonal o alinhamento ou disposição das ruas (passeios) para circulação de pessoas.
Essa conceitualização não vem posta em crise.
Como se viu, a divergência dos recorrentes perante a sentença está em que consideram necessário fazer uma cisão nas situações em que na área do quarteirão se verifiquem diferentes categorias de espaços urbanos.
Segundo a recorrente particular, nem teria sentido que se não fizesse a cisão, sob pena de se retirar qualquer efeito à inserção, nomeadamente do prédio em causa, em categoria de espaço de média densidade, pois que, afinal, pelo facto de o quarteirão estar também inserido em espaço de baixa densidade ficava tudo subordinado aos requisitos dos espaços de baixa densidade.
Ora, quanto à falta de qualquer efeito, não será assim.
São diferentes os requisitos exigidos nos diferentes espaços, eles não respeitam apenas a índices de utilização. Basta comparar, por exemplo, o que respeita à altura máxima de fachada no caso do artigo 25.º, n.º 1, a1) – 7,5 m (espaço de baixa densidade) -- e no caso do artigo 27.º, b) – 16 m (espaço de média densidade).
Mas, no fundamental, a tese dos recorrentes envolve descobrir no preceito um conceito que lá não vem inscrito, o conceito de “parte de quarteirão”, a integrar por elementos que variariam conforme as circunstâncias.
Não se antolha possibilidade de dar razão a essa tese, considerando-se que a considerações realizadas pela sentença, a propósito, merecem ser sufragadas.
Atenta a apreciação jurídica acabada de realizar, não releva a questão de ficar expresso em sede de matéria de facto o primeiro indicado em IA das conclusões do recorrente particular. É que a apreciação jurídica já teve em conta a possibilidade de se dar concretamente por assente esse facto.
2.2.4. Julgou ainda a sentença:
“Com relevo para a decisão a proferir ficou apurado na alínea J) do probatório que a construção tem quatro pisos acima e dois abaixo da cota de soleira e 18,00 m. de cércea.
Resulta ainda das informações dos serviços da Entidade Pública Recorrida que o troço do lado do arruamento onde se integra o edifício licenciado, na Av. … tem uma frente edificada inferior a dois pisos [cfr. alíneas K) e M)], pelo que deve concluir-se que a moda das cérceas da frente edificada do lado do arruamento do edifício é inferior a dois pisos.
Assim, tendo sido apurado pelos serviços que o lado do arruamento do edifício tem uma frente inferior a dois pisos, contraria as normas regulamentares o acto administrativo recorrido ao permitir para o local quatro pisos acima da cota de soleira, sendo claro que a moda das cérceas é aferível pelo lado do arruamento da construção a edificar.
Acresce ter sido ainda excedida a altura máxima da fachada, pois tendo o prédio 18 metros, é fácil de ver que excede o limite máximo estabelecido na alínea b) do art° 27° do RPDM, que prevê 16 metros.
Pelo que, também é de concluir em sentido favorável aos Autores, no sentido de o acto recorrido ter violado a alínea b) do art° 27° do RPDM de Cascais, sendo em consequência o mesmo nulo, nos termos do disposto na alínea b) do n° 2 do art° 52° do D.L. nº 445/91, de 20/11, na redacção introduzida pelo D.L. nº 250/94, de 15/10”.
É a esta parte do julgado que se refere especificamente o ponto III das conclusões da alegação da recorrente particular.
Vejamos.
Há dois subsegmentos no transcrito segmento da sentença – o que respeita à altura máxima da fachada e o que respeita à violação da moda das cérceas.
O que respeita ao segundo subsegmento não vem directamente impugnado no sector das conclusões acabado de indicar.
Existe, no entanto, uma precedente crítica, que lhe aproveita, que tem a ver com o acima analisado sobre a aplicação do artigo 27.º, a).
Na verdade, a recorrente particular, como também o recorrente público, entendem que não se aplica ao caso aquele preceito. Por isso, também não seria possível aplicar o preceito na vertente da moda das cérceas.
Não foi, no entanto, essa a conclusão a que se chegou, pelo que, também aqui, e na ausência de uma crítica particular, há-de manter-se o juízo realizado pela sentença. A diferença está em que não é convocável a alínea b) do artigo 27.º mas, ainda, a alínea a).
Quanto à alínea b).
O recorrente tem razão, pois em matéria de facto não foi fixado o que respeita à altura da fachada, e não pode ser fixada por dedução da cércea.
No quadro exposto, irreleva, também, a determinação da matéria de facto indicada pelo recorrente.
2.2.5. Finalmente, a recorrente particular invoca que os princípios da protecção da confiança e da segurança nas relações jurídicas não deviam ter deixado de ser considerados pelo Tribunal, em termos que impediriam a procedência da acção, em face das consequências manifestamente desproporcionadas que isso acarretaria em função dos interesses urbanísticos, económicos e sociais que estão em jogo.
Ora, o Tribunal apreciou a conformidade da actuação administrativa com as regras aplicáveis; concluindo pela violação dessa regras não poderia deixar de o declarar.
A matéria que a recorrente traz à colação não releva na fase anulatória dos actos administrativos impugnados, no quadro da LPTA aprovada pelo DL n.º 267/85, de 16 de Julho. Ela importará na fase executória.
3. Pelo exposto, concede-se provimento parcial ao recurso da recorrente particular, pois que se revoga a sentença enquanto declarou a nulidade do acto por excesso da altura máxima da fachada, com base na alínea b) do artigo 27.º.
Em tudo o demais, nega-se provimento aos recursos e mantém-se a sentença, com a convocação ainda da alínea a) do artigo 27.º do RPDM, no que respeita à moda das cérceas.
Custas pela recorrente particular. Taxa de justiça: 300 euros; procuradoria: 150 euros.
Lisboa, 14 de Outubro de 2009. – Alberto Augusto Oliveira (relator) - António Políbio Ferreira Henriques - Rosendo Dias José.


...

Resumindo e concluindo:

E agora? A CML vai mandar demolir o que viola o PDM?

P.S. Já agora, será que alguém sabe qual é o lote no Estoril (depreende-se que a norte do Casino) objecto desde acórdão do STA?

4 comments:

Anonymous said...

Mas haverá alguém com pachorra para ler isto do princípio ao fim???

Anonymous said...

LOBO VILLA

O objectivo deste propositado labirinto jurídico-burrocrático é confundir para reinar, ora dando razão a um, ora a outro,misturando conceitos de altura/cércea,densidade/índices de utilização "médios"....etc, o caos de Kafka, tudo no mesmo quarteirão (!) e segundo as abstractas "manchas" do PDM.
Ora do que há que recorrer é da figura do PDM ,que é difusa e não pode substituir a figura de PP(Plano de Pormenor),ao nível do quarteirão ! Claro que um PP define "demais" e as autarquias gostam é de "manchas" que criem dificuldades para depois venderem facilidades...
A conclusão é óbvia:o particular paga umas luvas/multas,"retoca-se" o PDM e toca a andar!(Não por acaso o PDM está em permanente "revisão")

Anonymous said...

Inteiramente de acordo com o post anterior.

Anonymous said...

Assim é. Palavreado confuso uma no cravo outra na ferradura e pronto, fez-se justiça. É a justiça dos que legislam e aplicam a lei. Para eles.