Monday, November 26, 2007
Vinho de Carcavelos enfrenta dias difíceis
In Sol Online (24/11/2007)
«O centenário Vinho de Carcavelos enfrenta um negócio «muito difícil» fora dos hipermercados, mas os produtores esperam um impulso com a criação, em Cascais, de um museu
Para António Gomes, 54 anos, é «quase impossível» não se render ao primeiro copo de Carcavelos e a célebre deixa de Fernando Pessoa «primeiro estranha-se, depois entranha-se» jamais poderia ser aplicada ao gosto adocicado - «menos enjoativo do que um Porto» - do vinho que produz a partir dos dez hectares de vinhas que pertencem à região vitivinícola de Bucelas, Carcavelos e Colares.
Caseiro desde 1988 da Quinta da Ribeira de Caparide, propriedade do Patriarcado de Lisboa, fala do seu «néctar dos deuses», com 19 a 22 por cento de álcool, obtido através das videiras que cultiva no local, no Mosteiro de Santa Maria do Mar e nas quintas privadas da Samarra e dos Pesos.
«Às vezes até se faz uma mistura - de uma vem o aroma, de outra o sabor, de outra o grau [de álcool]. Quanto maior a graduação das uvas menos aguardente leva, mas é um ingrediente obrigatório e escolhido pelo Instituto da Vinha e do Vinho», contou à Lusa esta semana, durante a poda da vinha da Quinta da Ribeira.
«Nem todos os anos se faz o Vinho de Carcavelos, porque tem de envelhecer na madeira cerca de três, quatro anos e seria uma despesa muito grande estar sempre a envasilhar. Retomou-se a produção em 1989 e depois em 1993 (6.000 litros), vinho que ainda estou a vender. Só quando despachar essa é que começo a vender a colheita já engarrafada de 1995 (5.000 litros) e a pensar na de 2004 (4.400 litros), que está a envelhecer nos pipos», explicou.
Passados três séculos sobre o início da produção do ex-libris de Carcavelos e cem anos sobre a demarcação da sua região, os números do responsável confirmam a tendência declarada pela Comissão Vitivinícola local, que aponta para uma diminuição de produção de 86,2 por cento entre os períodos de 1933/37 e 2000/04.
António Gomes garante não poder fabricar mais vinho, já que o consumo é cada vez menor e suportado apenas por alguns restaurantes, empresas e autarquias, que aproveitam a redução do preço da garrafa de 17,50 para 14 euros no caso de comprarem mais de trinta unidades.
«O negócio está mau, a venda é muito difícil. Não percebo como pode haver marcas que conseguem manter preços muito baixos - ou são de fraca qualidade ou misturados com vinhos de outros países, porque com máquinas, impostos alfandegários, material de engarrafamento e o nosso tempo e trabalho, eu não consigo, sinceramente», lamenta.
O que vale é que há «pessoas que apreciam muito: a Câmara compra grandes quantidades no Natal, há um senhor de Torres Novas que costuma vir cá buscar para revenda e até os reis de Espanha, que têm uma casa no Monte Estoril, compram sempre que vêm cá», refere.
Enquanto responsável no terreno da firma Seminagro, derivada do Patriarcado, António já rejeitou propostas de parcerias com grandes superfícies, por exigirem «demasiados» investimentos, e acredita que o melhor impulso para o negócio é a aposta das Câmaras de Cascais e Oeiras - onde existe uma pequena unidade de produção na Estação Agronómica Nacional - numa maior divulgação.
Por isso, considera que a exposição A Vinha e o Vinho em Carcavelos, patente no Centro Cultural de Cascais até 31 de Dezembro, e o projecto para o futuro Museu da Vinha e do Vinho de Carcavelos, na antiga Adega da Quinta do Barão, são já um sinal de que a actividade pode crescer.
A expectativa é partilhada pelo presidente do executivo camarário, António Capucho, que prevê inaugurar o espaço dentro de um ano e meio a dois anos, dado que o Plano de Pormenor do projecto deve ser aprovado no início de 2008, mas a obra tem ainda de ir a concurso.
«Faremos tudo o que estiver ao nosso alcance para manter e incentivar o cultivo. Só não posso é obrigar os proprietários a fazer o mesmo, mas grande parte dos terrenos é reserva agrícola e os privados têm descendentes», afirmou o autarca, quando questionado sobre a possibilidade de as quintas privadas virem a tornar-se áreas de urbanização.»
Vamos lá falar a sério: o vinho de Carcavelos NÃO existe. Já existiu. O que agora há é vinho com essa designação, feito em locais que não Carcavelos. E não existe porque as vinhas que o originavam foram arrancadas e destruídas para sempre, literalmente.
Falar-se de museu, na antiga adega da Quinta do Barão, é uma coisa; outra, bem diferente, é dizer-se que se vai plantar vinha na antiga Quinta do Barão. Basta ir lá para se perceber que isso é impossível. Coisas, «simples», como a poluição dos carros que circulam nas vias rápidas junto à propriedade, e terrenos que hoje são mato, solos completamente modificados e micro-clima alterado, tudo isso impede que o verdadeiro vinho de Carcavelos volte a ser uma realidade.
Dar-nos-emos por contente com as imitações.
«O centenário Vinho de Carcavelos enfrenta um negócio «muito difícil» fora dos hipermercados, mas os produtores esperam um impulso com a criação, em Cascais, de um museu
Para António Gomes, 54 anos, é «quase impossível» não se render ao primeiro copo de Carcavelos e a célebre deixa de Fernando Pessoa «primeiro estranha-se, depois entranha-se» jamais poderia ser aplicada ao gosto adocicado - «menos enjoativo do que um Porto» - do vinho que produz a partir dos dez hectares de vinhas que pertencem à região vitivinícola de Bucelas, Carcavelos e Colares.
Caseiro desde 1988 da Quinta da Ribeira de Caparide, propriedade do Patriarcado de Lisboa, fala do seu «néctar dos deuses», com 19 a 22 por cento de álcool, obtido através das videiras que cultiva no local, no Mosteiro de Santa Maria do Mar e nas quintas privadas da Samarra e dos Pesos.
«Às vezes até se faz uma mistura - de uma vem o aroma, de outra o sabor, de outra o grau [de álcool]. Quanto maior a graduação das uvas menos aguardente leva, mas é um ingrediente obrigatório e escolhido pelo Instituto da Vinha e do Vinho», contou à Lusa esta semana, durante a poda da vinha da Quinta da Ribeira.
«Nem todos os anos se faz o Vinho de Carcavelos, porque tem de envelhecer na madeira cerca de três, quatro anos e seria uma despesa muito grande estar sempre a envasilhar. Retomou-se a produção em 1989 e depois em 1993 (6.000 litros), vinho que ainda estou a vender. Só quando despachar essa é que começo a vender a colheita já engarrafada de 1995 (5.000 litros) e a pensar na de 2004 (4.400 litros), que está a envelhecer nos pipos», explicou.
Passados três séculos sobre o início da produção do ex-libris de Carcavelos e cem anos sobre a demarcação da sua região, os números do responsável confirmam a tendência declarada pela Comissão Vitivinícola local, que aponta para uma diminuição de produção de 86,2 por cento entre os períodos de 1933/37 e 2000/04.
António Gomes garante não poder fabricar mais vinho, já que o consumo é cada vez menor e suportado apenas por alguns restaurantes, empresas e autarquias, que aproveitam a redução do preço da garrafa de 17,50 para 14 euros no caso de comprarem mais de trinta unidades.
«O negócio está mau, a venda é muito difícil. Não percebo como pode haver marcas que conseguem manter preços muito baixos - ou são de fraca qualidade ou misturados com vinhos de outros países, porque com máquinas, impostos alfandegários, material de engarrafamento e o nosso tempo e trabalho, eu não consigo, sinceramente», lamenta.
O que vale é que há «pessoas que apreciam muito: a Câmara compra grandes quantidades no Natal, há um senhor de Torres Novas que costuma vir cá buscar para revenda e até os reis de Espanha, que têm uma casa no Monte Estoril, compram sempre que vêm cá», refere.
Enquanto responsável no terreno da firma Seminagro, derivada do Patriarcado, António já rejeitou propostas de parcerias com grandes superfícies, por exigirem «demasiados» investimentos, e acredita que o melhor impulso para o negócio é a aposta das Câmaras de Cascais e Oeiras - onde existe uma pequena unidade de produção na Estação Agronómica Nacional - numa maior divulgação.
Por isso, considera que a exposição A Vinha e o Vinho em Carcavelos, patente no Centro Cultural de Cascais até 31 de Dezembro, e o projecto para o futuro Museu da Vinha e do Vinho de Carcavelos, na antiga Adega da Quinta do Barão, são já um sinal de que a actividade pode crescer.
A expectativa é partilhada pelo presidente do executivo camarário, António Capucho, que prevê inaugurar o espaço dentro de um ano e meio a dois anos, dado que o Plano de Pormenor do projecto deve ser aprovado no início de 2008, mas a obra tem ainda de ir a concurso.
«Faremos tudo o que estiver ao nosso alcance para manter e incentivar o cultivo. Só não posso é obrigar os proprietários a fazer o mesmo, mas grande parte dos terrenos é reserva agrícola e os privados têm descendentes», afirmou o autarca, quando questionado sobre a possibilidade de as quintas privadas virem a tornar-se áreas de urbanização.»
Vamos lá falar a sério: o vinho de Carcavelos NÃO existe. Já existiu. O que agora há é vinho com essa designação, feito em locais que não Carcavelos. E não existe porque as vinhas que o originavam foram arrancadas e destruídas para sempre, literalmente.
Falar-se de museu, na antiga adega da Quinta do Barão, é uma coisa; outra, bem diferente, é dizer-se que se vai plantar vinha na antiga Quinta do Barão. Basta ir lá para se perceber que isso é impossível. Coisas, «simples», como a poluição dos carros que circulam nas vias rápidas junto à propriedade, e terrenos que hoje são mato, solos completamente modificados e micro-clima alterado, tudo isso impede que o verdadeiro vinho de Carcavelos volte a ser uma realidade.
Dar-nos-emos por contente com as imitações.
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