Tuesday, October 17, 2006

Troca de terrenos suscita dúvidas em Cascais

In Público (16/10/2006)
Luís Filipe Sebastião

"Oposição camarária questiona valor atribuído a quinta na área protegida e a três espaços urbanos para construção

A Câmara de Cascais pretende trocar três terrenos urbanos na Parede e no Estoril pela propriedade da Quinta do Pisão de Baixo, na zona do Parque Natural de Sintra-Cascais (PNSC). Os vereadores da oposição têm dúvidas quanto à avaliação efectuada pelos serviços camarários, mas o vice-presidente da autarquia acusa-os de que só querem "empatar".
A Quinta do Pisão de Baixo, situada na freguesia de Alcabideche, possui a área de 21,6 hectares. A propriedade encontra-se em zona vedada à construção pelo plano de ordenamento do PNSC. Mas, de acordo com um levantamento efectuado pelo Grupo Ecológico de Cascais, existem junto aos terrenos atravessados por um curso da ribeira das Vinhas várias edificações, compostas por um edifício principal, adegas, arrecadações, pocilgas e ruínas, estimadas no total de 4300 metros quadrados de área construída.
O grupo ambientalista elaborou um projecto no qual pretendia recuperar a linha de água e transferir a alegada capacidade construtiva existente na quinta para outra zona da propriedade, através da construção de 12 moradias de um piso. A comissão directiva do PNSC não chegou a analisar a proposta, uma vez que os mais de mil metros quadrados das vivendas ultrapassavam em muito os valores das construções preexistentes passíveis de serem recuperadas.
A Câmara de Cascais decidiu entretanto avançar com negociações com proprietários de terrenos no PNSC que estivessem na disposição de permutar essas áreas com terrenos municipais fora da zona protegida. O vice-presidente da autarquia, Carlos Carreiras (PSD), apresentou uma proposta para que a Quinta do Pisão de Baixo seja permutada com dois terrenos urbanos na Parede e um no Estoril. Uma avaliação dos serviços municipais levou em conta os alegados 4300 metros quadrados de área de construção no Pisão - incluindo arrecadações, pocilgas, piscina, adegas e ruínas - e estimou o valor da propriedade em 2,341 milhões de euros. No documento refere-se que não foi considerado o "respectivo estado de construção, materiais usados, idade e legalidade".
Os três terrenos do município, com uma capacidade construtiva de 5430 metros quadrados, numa área total de 1,2 hectares, foram avaliados em 2,307 milhões de euros. Carlos Carreiras justificou, num anexo da sua proposta, que se considerou atribuir à permuta o valor de 2,341 milhões de euros, por a valorização da quinta se situar acima do valor dos terrenos municipais e para "não haver lugar a compensação financeira por parte do município no valor decorrente da diferença". Isto apesar de, no mesmo documento, se acrescentar que o Pisão de Baixo, "não afectando o seu valor, apresenta uma capacidade muito baixa de se traduzir em liquidez para o seu actual proprietário".

Oposição contra avaliação
O vice-presidente defende que a quinta, situada ao lado da Quinta do Pisão de Cima, propriedade do Estado e gerida pela Misericórdia de Cascais, associar-se-á a outras propriedades municipais, como a Quinta de Vale de Cavalos e terrenos florestais junto à Pedra Amarela, "de modo a tornar-se num núcleo de desenvolvimento sustentável para uso e fruição da população, salvaguardando os ecossistemas e a sustentabilidade ambiental".
"Se a proposta for apresentada, o PS vota contra", adiantou o vereador Umberto Pacheco, que contesta o rigor da avaliação feita pelos serviços à quinta e aos terrenos municipais. O autarca socialista considera exagerados os metros quadrados de construção atribuídos no Pisão, o que "desequilibra a avaliação" e propõe que os vários terrenos sejam avaliados por uma entidade "independente". Por isso, precisa de mais tempo para estudar o processo.
Para o vereador Pedro Mendonça, da CDU, a proposta merece "dúvidas em termos do que se pode construir na Quinta do Pisão", o que coloca em causa o valor da avaliação. O vereador da Protecção Civil preconiza que devem ser acautelados os interesses do município, tornando mais transparentes as avaliações de terrenos rurais e urbanos. E defende um levantamento do património municipal para verificar "os terrenos que podem fazer falta à câmara para equipamentos".
Carlos Carreiras afirmou ao PÚBLICO que a proposta deve ser votada hoje, pois "é a terceira vez que vai a reunião de câmara e o assunto não deve parar à custa de uma oposição que só quer empatar". O vereador social-democrata acrescentou que o processo vai ser levado à assembleia municipal e reconheceu que, embora possa interessar ao proprietário, este "é um bom negócio para a câmara". A quinta ficará numa área de mil hectares que, além da criação de um corredor ecológico ao longo da ribeira, "servirá de tampão a toda a zona urbana, para que não possa entrar pelo parque natural". Um património onde, garante Carlos Carreiras, "não haverá habitação permanente" e servirá para a instalação de equipamentos de ecoturismo, investigação e de lazer. Para gerir estes espaços, juntamente com particulares, organizações e entidades públicas, a autarquia propõe-se constituir a Agência Cascais Natura.


PF