Thursday, April 26, 2007

A sociedade de regresso aos banhos no Estoril

In Público (23/4/2007)
Luís Filipe Sebastião

«Águas termais que se presumem brotem da serra de Sintra voltam a ser aproveitadas para fins terapêuticos dentro de um ano

Ir a banhos ao Estoril vai deixar de ter a ver apenas com uma simples deslocação à praia do Tamariz ou às adjacentes. O novo complexo termal deverá abrir portas durante o primeiro trimestre do próximo ano, meio século após o encerramento do antigo balneário, procurando diversificar a oferta turística na região.
A sociedade Estoril Plage decidiu apostar na recuperação das antigas termas. O complexo, em construção avançada na Avenida de Portugal, foi desenhado pelo arquitecto Manuel Gil Graça. O projecto faz parte de um plano urbanístico que prevê a ampliação da ala norte do Hotel Palácio (transformando a actual planta em formato de "t" em "u"), criando mais uma dúzia de quartos; a construção ao lado do Centro de Congressos do novo Parque Palácio, condomínio residencial e comercial, com 368 lugares de estacionamento subterrâneo, e o complexo termal.
As termas, segundo Pedro Garcia, administrador da sociedade Estoril Plage, serão um complemento importante para os clientes do Hotel Palácio, que terão acesso ao Spa e restantes serviços, mas foram desenvolvidas para "funcionarem com autonomia, de forma a servirem as outras unidades turísticas da região". O edifício, com quatro pisos e cave - a fachada principal com dois pisos dá para a Avenida de Portugal - reparte-se em duas áreas: lazer e clínica.
O clube de saúde e beleza terá piscinas termais, sauna, salas de inalação, banhos de vapor, lamas vichy, massagens e ginásio fitness/welness. Na clínica termal estará disponível uma piscina terapêutica, gabinetes médicos, ginásios, duche escocês, lamas e massagens.
Zona urbana controlada
De acordo com a base de dados de ocorrências termais, do Instituto Nacional de Engenharia, Tecnologia e Inovação, as águas do Estoril estavam indicadas para as doenças do aparelho respiratório, da pele, reumáticas e músculo-esqueléticas. Estas propriedades terapêuticas foram confirmadas por vários estudos médico-hidrológicos. Num dos últimos, do final de 2000, são acrescentadas as patologias imunitária e digestiva. No fim da década de 1980, a concessionária efectuou dois furos verticais de prospecção, captando água termal, com uma temperatura de 34 graus, a cerca de 260 metros de profundidade, com as propriedades das "águas do Estoril". Em 2004, a Direcção-Geral de Geologia e Energia autorizou um terceiro furo, para "garantir a existência de caudal" e verificar a qualidade do veio termal.
O administrador da sociedade Estoril Plage salienta que, actualmente, a qualidade das águas subterrâneas acaba "por estar mais garantida em meio urbano", quando existe um controlo efectivo sobre as infra-estruturas, ao contrário das zonas rurais, onde as fontes de abastecimento podem ser contaminadas por uma exploração agrícola ou por uma pecuária. Pedro Garcia esclarece que o lençol termal está protegido pela profundidade a que se encontra, presumindo-se que tenha origem na serra de Sintra e que, depois de "afundar cerca de cinco mil metros", ocorre mais perto da superfície no parque do Estoril.
O investimento no complexo deverá ascender a perto de 21 milhões de euros, já incluindo o valor do terreno onde se insere a infra-estrutura. Todavia, dada a sua natureza e interesse turístico para a região, o projecto concorreu a um apoio na área do turismo e foi-lhe atribuído um incentivo de 1,3 milhões de euros, dos quais 500 mil euros a título reembolsável.
O responsável da sociedade Estoril Plage mostra-se confiante na aposta do turismo de saúde, notando que metade dos utentes de termalismo no país são residentes na área da Grande Lisboa, mas que são frequentemente obrigados a deslocar-se para fora da sua área geográfica de residência, única forma para ter acesso a tratamentos termais.
Se se tiver em conta que os familiares, muitas vezes acompanham os pacientes, mas que nem todos podem partilhar dos mesmos interesses ou necessidades terapêuticas, a região do Estoril poderá também capitalizar novos turistas, nomeadamente ao oferecer a proximidade de uma extensa faixa litoral.
Pedro Garcia conta que o complexo termal possa abrir durante o primeiro trimestre de 2008 e que a exploração em pleno ocorra na Primavera do próximo ano.
21
Milhões de euros é o investimento total do novo complexo termal do Estoril.

1961
Foi o ano de encerramento da estância inaugurada quatro décadas antes por Fausto de Figueiredo.

34
Graus é a temperatura da água termal do "tipo Estoril" classificada oficialmente na base de dados das ocorrências termais do país.

1839
É a data da primeira publicação conhecida acerca das "moléstias" que poderiam ser tratadas pelas águas do Estoril.



Estância encerrou em 1961
23.04.2007
As águas que trataram das "moléstias" de D. José I
O aproveitamento das águas termais do Estoril encontra-se referenciado já desde os séculos XVII e XVIII. Neste último período, segundo rezam as crónicas, o rei D. José I procurava nas reconhecidas águas da Poça, e também nas do Estoril, a cura para as chagas que o afligiam nas pernas. As qualidades da nascente que então jorrava no parque ali existente são também apregoadas num modesto opúsculo impresso em 1839, com o sugestivo nome de Memoria sobre a utilidade e uso medicinal dos banhos do Estoril applicados ao tratamento das affecções cutaneas, e de muitas outras molestias...
Para assinalar o primeiro centenário das termas do Estoril, a direcção clínica do estabelecimento assegurava, em 1939, que os melhoramentos efectuados na captação proporcionavam "uma água bacteriologicamente pura, com maior termalidade e mais forte mineralização, por estar isenta de infiltrações". Os técnicos garantiam que, quando ingerida, a água exercia "uma acção benéfica sobre a mucosa gastro-intestinal, dissolvendo o muco", o que a tornava indicada em casos de gastrites e dispepsias (dificuldades de digestão).
Os tratamentos externos, pela "acção revulsiva [e] analgésica", cobriam vária formas de reumatismo, ciáticas e artropatia (articulações). Os benefícios dermatológicos e ginecológicos, assim como para as doenças cardiovasculares, também eram enunciadas.
As excelentes condições climatéricas da zona do Estoril, mesmo quando a maioria das estâncias termais estrangeiras se encontravam debaixo dos rigores do Inverno, eram igualmente apontadas como um trunfo do balneário aberto em 1918 por iniciativa de Fausto de Figueiredo. Argumentos que, no entanto, não impediram o seu encerramento em 1961, quando foi demolido o Hotel do Parque que o acolhia. L.F.S.
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